Page 112 - Trabalho do Ir.`. Ap.´. Prof. VALDINEI GARCIA
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protestante, a salvação era uma predestinação definida por Deus e cabia ao crente apenas
trabalhar para glorificar Deus, podendo gerar, com isso, uma acumulação de riquezas.
Para o catolicismo, a necessidade de trabalho foi decorrente do castigo de Deus para a
desobediência de Adão e Eva, gerando a necessidade dos homens tirar o sustento com o suor do
próprio rosto. Neste contexto, o trabalho era considerado uma obrigação e não uma virtude,
sendo um atributo indesejável e próprio dos escravos. Além disso, a acumulação de riqueza era
considerada como um grande obstáculo para a salvação e existia a idealização da pobreza
franciscana.
Na ética protestante, dava-se grande importância à acumulação, mas se abominava a
ostentação. A riqueza, como resultado da dedicação ao trabalho, não tinha outra razão de ser
que não fosse para as obras de Deus e para ajudar aqueles que necessitassem. Além disso, havia
grande valorização da educação para todos e se retirou o caráter pecaminoso da cobrança de
juros. Nesta nova ética do trabalho dizia-se que o sucesso era o maior indício de predestinação
à salvação e o pobre era suspeito de preguiça, o que constituía uma injúria a Deus. Como
resultado, as nações protestantes tiveram grande prosperidade no capitalismo e atingiram
grandes riquezas, enquanto várias nações católicas ficaram para trás.
Embora a caridade não fosse essencial para a salvação no contexto protestante, o dinheiro e o
trabalho eram considerados como um meio de expandir a obra de Deus, sendo que Lutero e
Calvino reconheciam que a caridade nascia da fé, da mesma forma que a maçã provinha da
macieira, ou seja: “não somos salvos pelas obras, mas fomos criados para as boas obras”. Como
resultante desta visão, a contribuição da população de países protestantes para filantropia
historicamente tem sido maior que as dos países católicos. Além disso, a percepção de que os
herdeiros não mereciam simplesmente ganhar as fortunas e os incentivos fiscais direcionados
para filantropia ajudaram a alavancar as contribuições para beneficência. Por outro lado, a
legislação fiscal brasileira não tem estimulado a doação de recursos para a filantropia, criando
grandes limitações para a doação de recursos para fins sociais.
Por esses motivos, na área de filantropia existe grande defasagem entre o Brasil e os EUA: por
ano, o setor privado nacional investe cerca de 2 bilhões de reais na área social, enquanto nos
Estados Unidos essa cifra atinge 70 bilhões de dólares, representando mais de 30 vezes,
embora o PIB dos EUA ultrapasse o PIB brasileiro em pouco mais de 6 vezes. Cada brasileiro
desembolsa, em média, 12 dólares por ano em doações e nos Estados Unidos são
desembolsados 390 dólares.
No que diz respeito às Organizações Sociais, enquanto nos EUA existem cerca de 40 mil
fundações, no Brasil, as 400 maiores entidades do terceiro setor representaram 90% da
atividade do setor em 2001. A 10ª fundação dos EUA tem 10 bilhões de dólares de patrimônio,
enquanto a nossa maior fundação tem 1 bilhão. A 20ª maior fundação brasileira tem
patrimônio de US$ 100 mil; a correspondente americana, US$ 1 bilhão, ou seja, 10 mil vezes
maior.
Considerando apenas o "The Giving Pledge", iniciativa liderada por Bill Gates, verificamos que
ela congrega cerca de 70 bilionários que se comprometeram a doar, em vida, metade de suas
fortunas para causas do bem. Enquanto isso, dos 54 bilionários que o Brasil possui, somente
dois são considerados bons parceiros do terceiro setor.
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