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FRAGMENTA HISTORICA A diplomacia de D. Manuel I segundo um
manuscrito da Biblioteca Britânica
pelos falecidos, o que eventualmente seria aspetos: por um lado, confirmam a tendência
tão motivado por uma necessidade de manter para o alargamento do quadro diplomático
relações cordiais com o reino de quem Portugal que se verificava desde o advento da dinastia
era mais próximo (desde logo a nível familiar) de Avis; por outro, espelham circunstâncias
como pela vontade de estar presente e específicas do reinado do Venturoso, como
acompanhar de perto momentos políticos que o acentuar de uma rivalidade entre Portugal
podem ser delicados. O ajuste de fronteiras e e Veneza pelo comércio de produtos
de espaços de conquista também era tratado ultramarinos (ao mesmo tempo que os dois
pela diplomacia destas potências. Os motivos estados eram aliados no combate ao Turco)
das embaixadas enviadas a Roma eram mais e o estabelecimento de uma nova aliança
diversificados, mas talvez se possa distinguir matrimonial com o ducado da Saboia.
três tipos de objetivos: prestar obediência aos Os motivos destas missões são muito
pontífices (no início do reinado e no princípio diversificados, mas há dois tipos que se
de novos pontificados); incentivar os papas à destacam: as embaixadas relacionadas com
promoção de novas cruzadas (retomando uma a participação portuguesa em alianças ou
prática do tempo de D. Afonso V); tratar de operações de natureza militar (especialmente
negócios eclesiásticos diversos. contra o Turco, mas também no quadro da
Em síntese, os catálogos de missões enviadas rivalidade entre Castela e a França); e as
de Francisco Dionísio de Almeida dão-nos conta demonstrações de amizade e cortesia por
da expedição média anual de uma embaixada potências estrangeiras, através da felicitação
ao estrangeiro, sendo os principais destinos do monarca pelo acesso ao trono ou da
Castela e o Papado e as maiores motivações apresentação de condolências na sequência
a negociação de alianças matrimoniais, a da morte das rainhas (com Castela e Veneza
demonstração de cortesia e acompanhamento como principais interlocutores). Houve ainda
da situação política peninsular, a prestação vários assuntos de natureza eclesiástica
de obediência aos pontífices e o incentivo à tratados com Roma. Face aos objetivos das
realização de novas cruzadas. embaixadas enviadas por D. Manuel ao
estrangeiro, assinala-se um peso muito menor
dos negócios matrimoniais, que é fácil de
3. Embaixadas recebidas entender: normalmente, as alianças deste tipo
forjavam-se no local de origem da potencial
Porventura, o panorama das missões acolhidas noiva; durante o reinado do Venturoso,
por Portugal durante o reinado de D. Manuel Portugal só teve duas infantas para ‘colocar’
é mais representativo da diversidade de no mercado matrimonial; uma delas, Isabel,
potências com quem o reino se relacionava do só viria a casar quando o Piedoso já se sentava
que o das embaixadas enviadas. Curiosamente, no trono, e apesar de se ter começado a tratar
o número de missões que tiveram Portugal do seu casamento ainda em vida do pai, essa
como destino é o mesmo das de movimento união esteve sempre associada à do príncipe
inverso: 24 (média de 0,9 por ano). Os D. João com a irmã de Carlos V, pelo que as
interlocutores é que são diferentes. Na linha negociações decorreram essencialmente em
da frente mantêm-se, como seria de esperar, Castela; a outra, Beatriz, viria a ligar-se ao
Castela e o Papado, com sete embaixadas cada. duque de Saboia, e foi esse matrimónio que
Seguem-se as ‘novidades’, que são Veneza motivou as três embaixadas enviadas pelo
(quatro missões), Saboia (três), Inglaterra e do que este documento dá a entender. D. Manuel terá
França (uma cada) . Estes dados refletem dois recebido, por exemplo, pelo menos uma embaixada
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oriunda do Império, em 1514, de que dá conta o relato
33 Regista-se também a receção de uma embaixada da estadia em Lisboa de Jan Taccoen van Zillebeke. Cf.
enviada pelas Comunidades de Castela, à revelia das Lisboa em 1514. O relato de Jan Taccoen van Zillebeke,
autoridades oficiais do reino. O alargamento do quadro coord. Jorge Fonseca, Lisboa, Edições Húmus, 2014, p.
diplomático foi, na realidade, ainda mais expressivo 124.
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