Page 28 - Jornal Gueto 2017
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CABRAL,
CABO VERDE E UMA
UNIDADE E LUTA ESPÉCIE DE LEGADO
NO FEMINISMO PERVERSO
NEGRO
Redy Wilson Lima
Na reflexão sobre feminismo negro desen-
volvida para a Universidade “Amílcar Cabral Vai fazer 40 anos que a bandeira do PAIGC
- Abel Djassi” que decorreu entre os dias 20 e foi erguida no estádio da Várzea, na cap-
22 de setembro de 2013 afirmámos uma ide- ital cabo-verdiana, e tal como Cabral, sob o
ologia distinta do feminismo convencional, pseudónimo Abel Djassi, escreveu em 1960,
que reconhecemos como uma prática capital- a geografia, a história e a cultura de Áfri-
ista feita por mulheres brancas para criarem ca continuam a não ser ensinadas nas esco-
oportunidades de acederem a estruturas de las cabo-verdianas. O desemprego, sobretudo
exploração e de exercício de poder de domi- o jovem, atinge limites preocupantes (muito
nação. Não nos revemos na luta de sexos que superior aos 16,8 por cento apresentados pelo
vê os homens como inimigos porque detêm INE), principalmente em São Vicente, 52
o poder que as mulheres reclamam para si. anos depois de similar constatação de Djassi
Acreditamos que o feminismo assim defini- na Conferência das Organizações Nacionalis-
do é um jogo de alternância do exercício do tas da Guiné e das Ilhas de Cabo Verde.
modelo de dominação, feito por mulheres O plano de desenvolvimento económico ou,
que querem ter protagonismo nos mesmos se quiserem, a agenda de transformação, mod-
moldes autoritários, capitalistas e racistas dos ificou a vida de muita gente, na medida em
homens brancos. que transformou-se numa fonte de enriquec-
Respondendo à necessidade de que “é preci- imento das autoridades superiores e médias
so ser um só para realizar um objetivo”, como da Administração Pública, dos empresários e
disse Amílcar Cabral, pretendemos nesta consultores que vivem à custa do Estado. A
prática de feminismo negro criar unidade en- tal pequena burguesia não só não se suicidou
tre mulheres negras e homens negros na luta como descobriu a fórmula de rejuvenescimen-
contra o sexismo, o racismo e a exploração. to económico e de dominação classista, repro-
Como afirmou Amílcar Cabral “a luta não é duzindo a desconsolidação democrática. No
feita de palavras mas de ação quotidiana, or- mundo rural, o neomorgadio impera, a água
ganizada e disciplinada.” Assim ser feminista pública é privatizada e os coitados de ontem
é agir. De que forma? Construindo práticas de erguem mansões desconectadas com a reali-
liberdade e autonomia entre nós, recorrendo dade local, reproduzindo a máxima de que o
apenas aos nossos meios, às capacidades e às escravo não tencionava ser livre mas sim um
nossas ideologias. Criando relações e recursos dia vir a ser o senhor…
entre nós livres de hierarquias e exploração. Se na época de Cabral era o Estado Coloni-
Acreditamos que as mulheres negras e os al o motor da história, hoje é o próprio par-
homens negros unidos pela ausência de dom- tido-Estado o motor da história. Ou seja,
inação patriarcal, são capazes de agir com au- continuamos com um Estado extractivo. Da
tonomia contra os sistemas de opressão racial oposição entre os que têm e os que não têm
e económico. Afirmamos por isso, unidade e
luta no feminismo negro.
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