Page 27 - Jornal Gueto 2017
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CABRAL,

                                                                                                                                       CABO VERDE E UMA

                                                                 UNIDADE E LUTA                                                       ESPÉCIE DE LEGADO

                                                                 NO FEMINISMO                                                                   PERVERSO

                                                                 NEGRO

                                                                                                                                                                Redy Wilson Lima


                                                                 Na reflexão sobre feminismo negro desen-
                                                                 volvida para a Universidade “Amílcar Cabral                          Vai fazer 40 anos que a bandeira do PAIGC
                                                                 - Abel Djassi” que decorreu entre os dias 20 e                       foi erguida no estádio da  Várzea, na cap-
                                                                 22 de setembro de 2013 afirmámos uma ide-                            ital cabo-verdiana, e tal como Cabral, sob o
                                                                 ologia  distinta do  feminismo convencional,                         pseudónimo Abel Djassi, escreveu em 1960,
                                                                 que reconhecemos como uma prática capital-                           a geografia, a história e a cultura de Áfri-
                                                                 ista feita por mulheres brancas para criarem                         ca continuam a não ser ensinadas nas esco-
                                                                 oportunidades  de acederem a estruturas de                           las cabo-verdianas. O desemprego, sobretudo
                                                                 exploração e de exercício de poder de domi-                          o jovem, atinge limites preocupantes (muito
                                                                 nação. Não nos revemos na luta de sexos que                          superior aos 16,8 por cento apresentados pelo
                                                                 vê os homens como inimigos porque detêm                              INE), principalmente em São  Vicente, 52
                                                                 o poder que as mulheres reclamam para si.                            anos depois de similar constatação de Djassi
                                                                 Acreditamos que o feminismo assim defini-                            na Conferência das Organizações Nacionalis-
                                                                 do é um jogo de alternância do exercício do                          tas da Guiné e das Ilhas de Cabo Verde.
                                                                 modelo de dominação, feito por mulheres                              O plano de desenvolvimento económico ou,
                                                                 que querem ter protagonismo nos mesmos                               se quiserem, a agenda de transformação, mod-
                                                                 moldes autoritários, capitalistas e racistas dos                     ificou a vida de muita gente, na medida em
                                                                 homens brancos.                                                      que transformou-se numa fonte de enriquec-
                                                                 Respondendo à necessidade de que “é preci-                           imento das autoridades superiores e médias
                                                                 so ser um só para realizar um objetivo”, como                        da Administração Pública, dos empresários e
                                                                 disse Amílcar Cabral, pretendemos nesta                              consultores que vivem à custa do Estado. A
                                                                 prática de feminismo negro criar unidade en-                         tal pequena burguesia não só não se suicidou
                                                                 tre mulheres negras e homens negros na luta                          como descobriu a fórmula de rejuvenescimen-
                                                                 contra o sexismo, o racismo e a exploração.                          to económico e de dominação classista, repro-
                                                                 Como afirmou Amílcar Cabral “a luta não é                            duzindo a desconsolidação democrática. No
                                                                 feita de palavras mas de ação quotidiana, or-                        mundo rural, o neomorgadio impera, a água
                                                                 ganizada e disciplinada.” Assim ser feminista                        pública é privatizada e os coitados de ontem
                                                                 é agir. De que forma? Construindo práticas de                        erguem mansões desconectadas com a reali-
                                                                 liberdade e autonomia entre nós, recorrendo                          dade local, reproduzindo a máxima de que o
                                                                 apenas aos nossos meios, às capacidades e às                         escravo não tencionava ser livre mas sim um
                                                                 nossas ideologias. Criando relações e recursos                       dia vir a ser o senhor…
                                                                 entre nós livres de hierarquias e exploração.                        Se na época de Cabral era o Estado Coloni-
                                                                 Acreditamos que as mulheres negras e os                              al o motor da história, hoje é o próprio par-
                                                                 homens negros unidos pela ausência de dom-                           tido-Estado o motor da história. Ou seja,
                                                                 inação patriarcal, são capazes de agir com au-                       continuamos com um Estado extractivo. Da
                                                                 tonomia contra os sistemas de opressão racial                        oposição entre os que têm e os que não têm
                                                                 e económico. Afirmamos por isso, unidade e
                                                                 luta no feminismo negro.


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