Page 6 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 6

1


                                                                     A PORTA ERRADA





                  O  que  aqui  se  conta  aconteceu  há  muitos  anos,  quando  vovô  ainda  era
                  menino.  É  uma  história  da  maior  importância,  pois  explica  como
                  começaram as idas e vindas entre o nosso mundo e a terra de Nárnia.

                         Naqueles  tempos,  Sherlock  Holmes  ainda  vivia  em  Londres  e  as
                  escolas eram ainda piores que as de hoje. Mas os doces e os salgadinhos
                  eram muito melhores e mais baratos; só não conto para não dar água na
                  boca de ninguém.

                         Naquela época vivia em Londres uma garota que se chamava Polly.
                  Morava numa daquelas casas que ficam coladas umas nas outras, formando
                  uma enorme fileira.

                         Uma bela manhã ela estava no quintal quando viu surgir por cima do
                  muro vizinho o rosto de um garoto. Polly ficou muito espantada, pois até
                  então não havia crianças naquela casa, apenas os irmãos André e Letícia
                  Ketterley, dois solteirões que moravam juntos.
                         Por  isso  mesmo,  arregalou  os  olhos,  muito  curiosa.  O  rosto  do
                  menino estava todo encardido. Não poderia estar mais encardido, mesmo
                  que ele tivesse esfregado as mãos na terra, depois chorado muito e então
                  enxugado as lágrimas com as mãos sujas. Aliás, era mais ou menos isso
                  que havia acontecido.

                         – Oi – disse Polly.

                         – Oi – respondeu o menino. – Qual é o seu nome?

                         – Polly. E o seu? – Digory.
                         – Puxa, que nome sem graça! – disse ela. – Acho Polly muito mais
                  sem graça.

                         – Não é, não. – É, sim.

                         – Bom, pelo menos eu lavo o rosto – disse Polly. – É o que você
                  deveria fazer, principalmente depois... – e parou. Ia dizer: “Principalmente
                  depois de ter chorado por aí”, mas achou que isso não seria muito delicado.

                         – Está bem, chorei mesmo – disse Digory, bem alto. Sentia-se tão
                  infeliz  que  nem  se  incomodava  que  soubessem  que  andara  chorando.  –
                  Você também choraria, se tivesse vivido a vida inteira no campo, e tivesse
   1   2   3   4   5   6   7   8   9   10   11