Page 53 - Cassandra
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              um dia de escola, estava com os meus amigos a aproveitar o nosso intervalo quando surge uma linda rapariga. Apro-

         ximou-se, perguntou se podia passar o intervalo connosco e nós dissemos que sim. Surpreendeu-me que ela tivesse pergun-
         tado e achei-o enternecedor. Não só era delicada e simpática, como também uma linda rapariga com uns maravilhosos

         olhos azuis. Com o passar do tempo, parecia que nos cruzávamos cada vez mais. Finalmente, tive coragem de a convidar

         para um almoço e foi aí que ambos confessámos os nossos sentimentos um pelo outro.

              Depois de alguns meses juntos, ela disse que estava na altura de conhecermos as respetivas famílias. Eu não achei
         que fosse uma boa ideia, tinha quase a certeza de que a minha não lhe iria achar grande piada, visto ela ser diferente daqui-

         lo a que estamos acostumados lá em casa. O que me fez pensar assim foi o facto de, sempre que lhe falava dos nossos jogos,

         ela ficava um pouco surpreendida e garantia-me que a sua família não fazia nada dessas coisas. Mas desde quando é que
         uma família não joga ao acordar dos mortos? É um jogo que fazemos desde que comecei a gatinhar. Vamos todos para as

         traseiras da casa, onde está o nosso cemitério privado, e desenterramos os familiares enquanto partilhamos histórias sobre
         as suas mortes. Outro jogo que a minha namorada desconhecia, e que me chocou imenso, era o jogo da cadeira elétrica.

         Como é possível ela nunca ter jogado este clássico? Eu e o meu pai passávamos horas a ver quem aguentava mais tempo.

         Para não falar da habitual esgrima até ao primeiro derrame de sangue... Como já disse ela não era normal e, se calhar, era
         isso que me atraía.

              Fui eu o primeiro a ser convidado para conhecer a família dela e nunca me esquecerei daquele nervosismo de não

         querer causar uma má impressão aos pais. Foi um jantar e correu lindamente, eram muito simpáticos, foi uma boa experi-
         ência. Mas confesso que achei estranho eles não terem um cemitério privado. Agora era a vez de ela conhecer os meus pais.

         E continuava com o pressentimento de que algo não ia correr bem.

              Para prevenir quaisquer situações constrangedoras, falei com os meus pais, Sancho e Paulo. Disse-lhes o quão impor-

         tante ela era para mim e avisei que ela tinha costumes diferentes dos nossos. Para surpresa minha, eles responderam:

         "Filho, és tudo para nós. Temos muito orgulho no jovem em que te estás a tornar e, por isso, vamos respeitar a tua namora-
         da seja ela como for. Não nos cabe a nós privar-te da felicidade." Nesse momento apercebi-me do quão sortudo era por ter

         uns pais assim e de seria disparatado ter medo de estar com quem estou. Para eles, primeiro está o meu bem-estar. Se as-
         sim não fosse, eles é que teriam de se adaptar, não prejudicando a minha felicidade.






























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