Page 186 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
P. 186
Sem se alarmar de imediato pelo deslumbramento que o dominara por não
conseguir avaliar corretamente a entrega de sua mente e de seu coração,
pensou que o seguir da vida, os dias sucedendo-se aos dias, trariam o
necessário arrefecimento da paixão. Esperara que o tempo se encarregasse de
curar os desvarios e providenciasse a calma que temperaria sua vida de casal.
Viveram assim, quatro anos e meio de loucura apaixonada. Com um gradual
e inexorável aumento da necessidade de um pelo outro até que Jacques se
descobriu incapaz de seguir o compasso natural da vida sem a percepção da
sintonia do seu inspirar e expirar em cadência uníssona à respiração de
Isabeau.
E foi então que ela resolveu arrumar caixas velhas deixadas nas prateleiras
mais altas do armário do quarto e a história de um jovem brilhante e
ambicioso, que desejara marcar o mundo com as suas descobertas, aparecera
sob uma assinatura gravada pelo nome Lévi-Strauss.
E Jacques se lembrou de quem era.
Ao contar sua história. Do seu nome herdado ao avô anônimo e da
descendência de um tio avô que era uma das personalidades mais influentes
da sua época, reviu a trajetória de uma vida que pretendera suprema, e se
reconheceu como o único traidor de si mesmo. Despertou para o desespero da
sua condição subserviente a uma paixão doentia que não admitiria mais nada
e nem permitiria mais nada e sentiu todo o horror que sentiria se estivesse se
consumindo pelo vício de alguma droga mortal que exigiria, para a
recuperação da sua dignidade humana, os tormentos da abstinência.
Percebeu com uma sabedoria transcendente ao saber mundano que não
poderia ser certo, ou bom, ou justo, ou verdadeiro, um ser humano precisar
tanto de outro ser humano, a ponto de depender da sua presença física para
conseguir respirar.