Page 107 - As Viagens de Gulliver
P. 107

vezes na Inglaterra com respeito a uma doninha.
          Por fim, ousou tomar-me pelas nádegas e ergueu-me a toesa e meia da
      sua  vista,  a  fim  de  examinar  o  meu  rosto  mais  atentamente.  Adivinhei-lhe  a
      intenção e resolvi não fazer a menor resistência, enquanto ele me suspendia no ar
      a mais de sessenta pés do chão, ainda que me apertasse cruelmente as nádegas,
      receando  que  lhe  escorregasse  por  entre  os  dedos.  Tudo  o  que  ousei  fazer  foi
      limitar-me a olhar para o céu, e pôr as mãos em atitude suplicante e a proferir
      algumas palavras num tom muito humilde e muito triste, em conformidade com
      o estado em que me encontrava então, porque a todo o momento me arreceava
      de que me quisesse esmagar, como de ordinário esmagamos certos animaizinhos
      daninhos que queremos matar; ele, no entanto, pareceu contente com a minha
      voz e os meus gestos e principiou a olhar-me como um objeto curioso, ficando
      bastante surpreendido ouvindo-me falar.
          Entretanto, não podia deixar de gemer e de chorar, e, voltando a cabeça,
      fazia-lhe  perceber,  tanto  quanto  podia,  quanto  me  magoava  o  seu  índice  e  o
      polegar. Pareceu ter compreendido a dor que eu sentia, porque, erguendo uma
      aba do seu gibão, me colocou carinhosamente dentro dela e correu logo ao amo,
      que era o único lavrador, o mesmo que eu tinha visto no campo havia pouco.
   102   103   104   105   106   107   108   109   110   111   112