Page 141 - As Viagens de Gulliver
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A rainha zombava frequentemente de mim, por eu mostrar tanto medo, e
      costumava perguntar-me se as pessoas do meu país eram tão cobardes como eu.
      Acontecia que o reino, durante o Verão, era infestado de moscas, insetos odiosos
      que,  quase  do  tamanho  de  cotovias,  não  me  deixavam  em  paz,  ao  almoço,
      zumbindo constantemente aos meus ouvidos. Por vezes pousavam sobre a minha
      comida, onde deixavam o seu asqueroso excremento ou os ovos, que para mim
      eram bem visíveis, ao contrário do que acontecia aos habitantes deste país, cujos
      enormes olhos não eram tão penetrantes como os meus na percepção dos objetos
      mais pequenos. Outras vezes, pousando sobre o meu nariz ou testa, feriam-me ao
      vivo, deixando atrás de si um cheiro tremendo e rastos daquela substância viscosa
      a que os nossos especialistas atribuem a capacidade de aquelas criaturas para se
      deslocarem com as patas assentes no teto e de dorso para baixo. Dificilmente me
      defendia destas criaturas, não conseguindo reprimir um sobressalto cada vez que
      se  aproximavam  da  minha  cara.  Nestas  alturas  era  certo  o  anão  apanhar  uns
      quantos destes insetos na sua mão, como os rapazes da escola fazem entre nós, e
      libertá-los  de  repente  debaixo  do  meu  nariz,  de  propósito  para  me  assustar  e
      divertir  a  rainha.  Não  tinha  outro  remédio  senão  esquartejá-los  com  a  minha
      faca, enquanto voavam à minha volta, no que a minha habilidade era bastante
      admirada.
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