Page 76 - As Viagens de Gulliver
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Sou agora obrigado a defender aqui a reputação de uma excelente dama,
que sofreu inocentemente por minha causa. O tesoureiro resolveu ter ciúmes de
sua mulher, que, como algumas más-línguas o informaram, se teria tomado de
uma violenta afeição pela minha pessoa, tendo corrido durante algum tempo na
corte o boato de que ela uma vez me visitara particularmente em minha casa.
Isto declaro, solenemente, ser a mais infame das mentiras, sem quaisquer
fundamentos para além das demonstrações de inocente amizade que Sua Graça
se dignou dispensar-me. Confesso que mais de uma vez veio a minha casa, mas
sempre publicamente acompanhada, na carruagem, de, pelo menos, mais três
pessoas, normalmente a sua irmã, a jovem filha e alguma amiga particular; mas
de igual modo costumavam proceder muitas outras damas da corte. Os meus
criados podem testemunhar se alguma vez viram uma carruagem à minha porta
sem saber quem estava dentro. Sempre que um criado me anunciava alguém,
era costume dirigir-me imediatamente para a porta e, após os cumprimentos,
pegar cuidadosamente na carruagem e nos dois cavalos (pois, se eram seis, o
postilhão desatrelava sempre quatro) e colocá-los sobre a mesa, que eu protegera
em volta com um rebordo de cinco polegadas de altura, para evitar acidentes.