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ESPECIAL BICENTENÁRIO 2022
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vatizações e na entrega das riquezas Foto: Rafael Kennedy/Mídia Ninja
naturais como uma forma de equivo-
cadamente salvar-lhes deste mal. Sob
outra face, mas no interior do mesmo
problema, a eficiência do Estado tam-
bém é motor pra esse mesmo movi-
mento. Em tempos de auxílio emer-
gencial e no caos da distribuição do
recurso, não é incomum ouvir de al-
guns beneficiários estabelecerem rela-
ção entre as debilidades desse processo
e os bancos públicos.
“Roubalheira” ou funcionalidade,
as duas faces de acusação do público
pertencem frequentemente a mesma
moeda da defesa da predação do se-
tor privado. De forma consciente ou
inconsciente, a possibilidade de con-
quista e fortalecimento do Estado con-
tra os mesmos corruptos é deixada de
lado em favor de uma gradual entre- e nem exceções, mas uma regra entre Se falar de culturas implica reco-
ga aos mesmos sujeitos, responsáveis as perspectivas de projetos nacionais nhecer seu diálogo com diferentes as-
pelo empreendimento de políticas an- empreendidas pelas elites dominan- pectos da vida social, pensar a sua capa-
tipopulares e do fosso social existente tes. Entre o ontem e hoje, formas de cidade de intersecção com o político,
no país. Por essa via hegemônica, o discriminação e negação dos agentes o econômico e outras esferas implica
combate à corrupção leva ao forta- sociais e históricos que construíram em refletirmos profundamente sobre
lecimento do poder dos verdadeiros este país foram manipuladas em prol quem somos e o que queremos. Pro-
corruptores, sendo um dos principais de reflexões sobre uma cultura nacio- blematizar uma série de arcaísmos en-
desafios nossos a denúncia desse pro- nal ou uma civilização de origem. raizados em nossa sociedade significa
cesso perverso. No Brasil no caminho do aprofun- iniciar a construção de um projeto de
damento neoliberal, da intolerância, transformação social que tenha tam-
Breves considerações finais e do falseamento de seus conflitos, do bém no horizonte a transformação
longos problemas apego ao passado colonial, da negação humana, pois, como bem demonstrou
da escravidão e do racismo, da xenofo- Edward Said, imperialismo e cultura
Entre um passado distante e ide- bia dirigida a determinados povos, em andam de mãos dadas, sendo um desa-
alizado, a negação da experiência re- contrapartida da submissão à outros, fio às forças progressistas enfrentarem
cente e a crença de um presente em uma política de resistência passa tam- as amarras ideológicas, discursivas e
rupturas, o bolsonarismo constrói sua bém por uma forte inserção nos deba- simbólicas que ainda jogam forte peso
própria narrativa de Estado, sociedade tes culturais, em defesa da pluralidade contra uma política de emancipação
e nação. Apesar das especificidades, das identidades brasileiras e de denún- dos povos.
muitas das questões colocadas, quando cia ao reacionarismo representado pe-
situadas sob um ponto de vista histó- los discursos e ações do atual governo MATEUS SANTOS é historiador e
rico mais profundo, não são novidades e de seus apoiadores. militante do PT Bahia
98 ESQUERDA PETISTA #11 - Setembro 2020