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ESPECIAL BICENTENÁRIO 2022
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tipo de organização social, massacres Conselheiro, não seria uma maneira Nos encontros e desencontros da
como a Guerra de Canudos marcaram de negar-lhes o direito ao exercício História, a atualidade brasileira pro-
negativamente esta trajetória. Naque- da religião a partir de sua experiência duz novos Canudos e novos projetos
la ocasião, o forte sertanejo narrado de vida? Em nome de uma espécie de de construção nacional a partir de
por Euclides da Cunha foi também enquadramento religioso, além de in- princípios excludentes. Os novos serta-
condenado pela sua cultura, isto é, por teresses outros, fez de uma parte do nejos hoje são representados por aque-
desenvolver uma forma de inserção Sertão da Bahia virar pó, alvo de exal- les e aquelas que são alvo da intole-
social bastante própria. O “fanatismo” tação por determinados segmentos in- rância religiosa, como os movimentos
atribuído aos homens e mulheres de teressados em negar-lhe a sua natureza de invasão aos terreiros e negação da
Belo-Monte, liderados por Antônio de resistência. religiosidade afro-brasileira ou mesmo
manifestações islamofóbicas, ambas
fruto de estereótipos cristalizados no
imaginário de uma parcela significati-
va da sociedade, aprofundados em con-
textos políticos como o atual.
Na relação entre imigração e cul-
tura, houve um retrocesso significativo
nas políticas migratórias brasileiras,
além da continuidade nas discrimina-
ções contra venezuelanos, haitianos e
outras nacionalidades presentes nos
últimos anos. Em contrapartida, uma
desproporcional política de portas
abertas aos estadunidenses, represen-
tando uma contradição frente à ten-
dência restritiva daquele país em rela-
ção aos demais povos americanos ao
sul do Rio Bravo.
A luta por uma cultura nacional
avançou ao longo de nossa História.
Considerando o contexto político a
partir dos anos 30, em meio a uma
efervescência política e social, novos
contornos nessa trajetória produziram
marcas ainda visíveis na atualidade.
Em Casa Grande & Senzala, publicado
Ilustrações do livro “Casa Grande&Senzala em quadrinhos” (Editora Global) em 1933, Gilberto Freyre começou a
desenhar um Brasil da harmonia ra-
Em Casa Grande & Senzala, publicado em 1933, cial, da singularidade da experiência
Gilberto Freyre começou a desenhar um Brasil da histórica e do louvor à miscigenação.
Sem abandonar os determinismos ra-
harmonia racial, da singularidade da experiência cistas, o autoproclamado “menino de
histórica e do louvor à miscigenação engenho” pensou uma narrativa de
96 ESQUERDA PETISTA #11 - Setembro 2020