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ESPECIAL  BICENTENÁRIO




          jou sobre Mário, e todo o grupo, um es-  ência para gerenciar interesses diversos   sores, pintores, arquitetos e engenhei-
          tigma que renderá muitas laudas entre   e por vezes conflitantes de capitalistas,   ros. Ou seja, o estrato social que suava
          afirmar e negar o rótulo que os vincu-  rentistas, tenentistas e artistas.  Muito   para produzir os produtos concretos
          lava a um movimento novo, de caráter   mais ainda para a classe trabalhadora.  do modernismo, mas não se percebiam
          radical e combativo, mas feito no velho    Por decorrência da expansão ca-     como parte do proletariado, ou seja
          mundo do qual os novos daqui dese-     pitalista, milhares de trabalhadores    como classe trabalhadora.
          javam distinguir-se. Mas essa não foi a   de origens étnicas e culturais diversas   Os nomes mais presentes são:
          principal contradição originária do mo-  também organizaram publicações, as-   Oswald de Andrade, Mário de Andrade,
          vimento.                               sociações, partidos, teatros, festas, mobi-  Menotti Del Picchia, Guilherme de Al-
             A Semana de 22, embora tenha        lizações e greves. Estes, fisicamente, não   meida, Agenor Barbosa, Plínio Salgado,
          sido realizada no ano do centenário do   faziam parte das redações, salões, cafés   Cândido Motta Filho e Sérgio Milliet
          Grito do Ipiranga, foi sem dúvida orga-  e galerias onde circulava a intelectuali-  (escritores e poetas); Anita Malfatti, Di
          nizada para causar ruídos dissonantes   dade modernista, mas estavam cada vez   Cavalcanti, Vicente do Rego Monteiro
          aos que entoavam o hino da celebração   mais retratados nesses espaços como    e John Graz (pintores); Victor Breche-
          de independência. Ou seja, não preten-  objetos de debates e temáticas de edito-  ret e W. Haeberg (escultores); Antonio
          dia ser mais um gesto laudatório do po-  riais e mostras pictóricos.           Moya e George Przirembel (arquitetos).
          der, pelo contrário. Porém, sua imedia-    No cenário internacional, avanços   Do Rio de Janeiro se aproximaram Ma-
          ta captura pelo novo poder econômico   no campo das comunicações e transpor-   nuel Bandeira, Renato Almeida,  Villa-
          da aristocracia paulista é sua principal   tes faziam chegar cada vez mais rápido   -Lobos, Ronald de Carvalho, Álvaro
          contradição de origem.                 os  novos rumos  trilhados  por outros   Moreyra e Sérgio Buarque de Holanda.
             Em seus primeiros anseios, como     povos, nas artes, na técnica e na políti-   Tarsila do Amaral soma-se ao gru-
          observa Lúcia Lippi Oliveira, para o   ca. Nos anos finais da década de 1910,   po pouco mais tarde e, com Mário de
          movimento                              da Europa chegavam perguntas deixa-     Andrade, Oswald de Andrade, Anita
                   “Era preciso inventar a autenti-  das sem respostas pela guerra, assim   Malfatti  e  Menotti  del  Picchia, forma
               cidade (...) o mito da pureza cultural   como também a inquietante afirmação   um grupo mais constante que ficou
               se acopla ao espírito do povo, popu-  com que o povo russo introduziu a re-  conhecido como o “Grupo dos Cinco”.
               lar passa a ser o lócus da autenticida-  volução comunista no vocabulário das   Diversos grupos modernistas, revistas
               de (...) se caracteriza pelo combate   possibilidades políticas, que no Brasil   e manifestos foram criados no intento
               ao passado, pela elaboração de uma   ganha sigla e face pública com a funda-  de estruturar um campo de atuação
               estética adequada à vida moderna   ção do Partido Comunista do Brasil, em   profissional para produção de conhe-
               e pela captação da realidade atual   1922.                                cimento e práxis cultural: Movimento
               entendida como a vida urbana e in-    Em meio a isso, o embate concei-    Pau-Brasil, Movimento Antropofágico,
               dustrial que tinha São Paulo como   tual sobre a defesa de  uma produção   Grupo modernista-regionalista de Reci-
               exemplo máximo”  (OLIVEIRA, p.    cultural nacional, em contraposição a   fe, Movimento Verde-Amarelo e Escola
               189-190, 1997).                   submissão aos cânones estrangeiros, se   da Anta. Também variadas publicações:
                                                 deu atravessado pela realidade de uma   Klaxon (1922), Estética (1924), A Revista
             Afirmar o nacional autêntico tam-   população culturalmente diversifica-    (1925), Terra Roxa e Outras Terras (1926)
          bém era desejo da elite econômica pau-  da, não apenas entre o operariado e os   e Revista de Antropofagia (1928).
          lista, que não era mais predominante-  trabalhadores do campo. Também nos          Idealizada para ser um evento, a
          mente agrária, e acelerava a multiplica-  setores médios, que trabalhavam na es-  Semana realmente se multiplicou em
          ção de atuações capitalistas. Na esfera   fera intelectual stricto sensu, alguns pró-  ações catalisadoras de energias e inte-
          política, o desenho democrático da jo-  ximos da alta burguesia, atuando como   resses distintos, em  grande parte sob
          vem república já dava sinais de defici-  escritores, jornalistas, fotógrafos, profes-  o guarda-chuva do nacional popular.



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