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LIVROS




          posta  globalmente  coordenada,  uma   a escolha dele no livro seja ironizar a   intercapitalista  impulsiona  o  desen-
          forma daquilo que certa vez se chamou   direita  que  frequentemente  costuma   volvimento de novas tecnologias; esse
          de comunismo”. E define seu conceito:   taxar qualquer medida de cunho mais    “dinamismo tecnológico [...] está in-
          “Não me refiro aqui ao comunismo à     social de  “comunismo”. No entanto      corporado nas estruturas globais do
          moda antiga, é claro, mas simplesmen-  isso não fica completamente claro no    capitalismo”. Dentre essas  tecnologias
          te a algum tipo de organização global   texto. Foi Christian Dunker que, ao es-  desenvolvidas existem algumas que se
          capaz de controlar e regular a econo-  crever um artigo sobre a vida de Zizek   tornam aplicáveis de forma generaliza-
          mia, bem como de limitar a soberania   na revista Cult (disponível na internet),   da, por exemplo, a tecnologia compu-
          de Estados-nação quando assim for      acabou por me suscitar uma chave de     tacional. A tecnologia como produto
          necessário”. O rebaixamento do termo   leitura para suas obras incluindo essa.  genérico comercializado por produ-
          talvez se deva à escolha do público-alvo   Já David Harvey no livro “Antica-   tores e consumidores é bastante espe-
          do autor que, em diversos trechos, pa-  pitalismo em tempos de pandemia” colo-  cífica do capitalismo. Para que assim
          rece ser os próprios liberais. Por exem-  ca para si mesmo a seguinte pergunta:   se desenvolva é preciso a separação e
          plo:  “Não estou sendo utópico, não    “como um anticapitalista pensaria a     especialização do trabalho intelectual
          recorro a uma solidariedade idealizada   respeito de circunstâncias desse tipo?”   e braçal, de forma que o conhecimen-
          entre os povos. Pelo contrário: a atu-  E responde que, conforme Marx, “de-    to que antes pertencia aos trabalha-
          al crise demonstra claramente como a   vemos selecionar os aspectos da socie-  dores  passe  agora  a ser  incorporado
          solidariedade e a cooperação globais   dade burguesa em colapso que contri-    na máquina, tornando o trabalhador
          interessam à sobrevivência de cada um   buirão para a emancipação dos traba-   um mero apêndice desta. Esse é o fe-
          de nós, como essa é a única coisa ego-  lhadores”. Para tanto ele desenvolve   tiche da tecnologia que aparece como
          ísta racional a se fazer”. Pode ser que   o seguinte raciocínio: a concorrência   sendo dotada de inteligência própria,
                                                                                         enquanto o trabalhador executa tare-
         Foto: Alexandre Maciel/Intersindical                                            mente involuntária – reduz o trabalho
                                                                                         fas apenas mecânicas. Mas o ponto é o
                                                                                         seguinte: o capital – “de forma inteira-


                                                                                         humano [necessário] a um mínimo”. A
                                                                                         “sua tendência é sempre, por um lado,
                                                                                         de criar tempo disponível, por outro
                                                                                         lado, de convertê-lo em trabalho exce-
                                                                                         dente [de onde retira seus lucros]”.
                                                                                             Como romper com esse sistema?
                                                                                         A resposta de Harvey é a luta coletiva,
                                                                                         a organização dos trabalhadores, por
                                                                                         mais difícil que isso seja, dadas as rela-
                                                                                         ções de opressão de classe. E como não
                                                                                         há movimento revolucionário sem te-
                                                                                         oria revolucionária, destaca a necessi-
                                                                                         dade de
                                                                                                   construção de um novo pa-
                                                                                               radigma político para enfrentar a
                                                                                               questão da desigualdade, por meio
          David Harvey: “Devemos selecionar os aspectos da sociedade burguesa em colapso que   de uma crítica aguda e profunda de
          contribuirão para a emancipação dos trabalhadores”





                                                                                         ESQUERDA PETISTA #11 - Setembro 2020  81
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