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ou melhor, em todos esses sentidos, a religião serve para explicar — e
certamente o faz de modo mais satisfatório que a filosofia ou a
ciência, pois há sofrimento, doença, calamidade, injustiça e aflição
neste mundo. E mais: ela pode até mesmo dizer por que certa
pessoa está sofrendo o que sofre, o que não deixa de ser enorme
consolo para quem vive e acompanha a aflição. Num certo sentido,
portanto, a religião oferece respostas a perguntas que,
rigorosamente, não podem ser respondidas pela ciência ou pela
tecnologia.
Mas, além disso, a religião marca e ajuda a fixar momentos
importantes na vida de todos nós. Desse modo, nascimentos,
batizados, crismas, comunhões, casamentos e funerais — todos os
momentos que assinalam dramaticamente uma crise de vida e uma
passagem na escala da existência social — são marcados pela
presença da religião, que legitima com o aval divino ou sobrenatural
uma passagem que se deseja necessária; algo que esteja inscrito, não
apenas numa convenção inventada pelos homens, mas no próprio
projeto.
Essas formas de marcar entradas e saídas do universo religioso são
em geral dramáticas, exigindo ritos especiais e trabalhados que
operam como mediadores. Tal como acontece no nosso conhecido
ritual do batismo, em que a criança entra na Igreja Católica e, ao
mesmo tempo, na sociedade, ganhando simultaneamente “pais
adotivos” que reforçam, como padrinhos, suas obrigações como ser
social. Assim, embora a pessoa seja concebida por genitores (os seus
pais biológicos), há uma exigência de padrinhos (ou pais sociais) para
que ela possa penetrar no cerne da vida social, o que, no mundo
católico, se realiza através da Igreja e do ritual apropriado do
batismo. O mesmo ocorre num casamento, onde também existem
padrinhos — mediadores — marcando e indicando que a cerimônia
é algo público, algo definitivamente social.
Todos esses aspectos formam aquilo a que chamamos religião