Page 92 - O Que Faz o Brasil Brasil
P. 92

pedidos num só, que deve “subir” aos céus levado pelas harmonias

                  das  vozes  que  o  entoam.  De  fato, no nosso modo de conceber o
                  espaço religioso, a linha vertical e hierarquizada, que relaciona o céu

                  com  a  terra  e  o  alto com o baixo, é algo dominante e crítico. O

                  “alto”, conforme sabemos muito bem, é tudo que é superior, tudo que

                  deve ser mais nobre e mais forte, tudo que tem mais poder. É lá nessa
                  esfera situada em cima que moram os anjos, os santos e  todas  as

                  entidades que nos podem proteger e guiar os destinos. O “baixo” é a

                  terra em que vivemos: vale de lágrimas onde sofremos, trabalhamos e

                  finalmente morremos. A reza, a festividade religiosa e o canto
                  propiciatório coletivo são meios  de se chegar até essas regiões

                  superiores, ligando o aqui e agora com o além e o infinito.

                         Seria até mesmo possível, nesta linha de abordagem, dizer que

                  certas rezas — ou formas de  comunicação com o sobrenatural  —

                  seriam mais fortes ou mais fracas que outras, tudo dentro da nossa
                  lógica de gradação dominante. Assim, as formas  que  implicam  o

                  envolvimento da maioria dos sentidos  seriam  provavelmente  mais

                  fortes  e  irresistíveis  aos  santos, deuses e espíritos do que as
                  modalidades em que apenas um  sentido  está  envolvido.  As  formas

                  individuais, por sua vez, seriam normalmente as mais fracas, embora a

                  fé, a esperança e a caridade de cada um sejam também elementos

                  importantes no atendimento de suas súplicas ou preces. Do mesmo

                  modo, as súplicas acompanhadas de objetos, na forma de
                  promessas, oferendas e sacrifícios, são naturalmente mais fortes que

                  um simples pedido verbal, pois  que  elas  implicam um ato de

                  cometimento muito mais denso e dramático,  às vezes exigindo o

                  gasto de parcelas de dinheiro que são críticas  em  termos  da
                  economia doméstica e pessoal do ofertante. Além disso, a promessa é

                  um pacto que obriga os dois lados a alguma ação positiva no sentido

                  de resolver o problema apresentado. Se eu, assim, peço uma graça e

                  logo em seguida me sacrifico com a oferta de algo precioso para o
                  santo (ou santa) de minha devoção, a lógica social faz com que ele
   87   88   89   90   91   92   93   94   95   96   97