Page 96 - O Que Faz o Brasil Brasil
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algo rotineiro, se entre a Umbanda e o Kardecismo existem também
crenças em encarnação e na teoria do Karma (que vem da Índia),
há igualmente diferenças entre todas essas formas, já que na
Umbanda o contato é muito mais com os deuses do que com os
espíritos desencarnados dos mortos. Por outro lado, o Espiritismo
considera-se codificado, ao passo que a Umbanda é uma religião sem
codificação e com uma teologia aberta a muitas variações.
Mas, apesar de todas essas diferenças, a variedade é limitada,
porque essas formas mais diversas coexistem tendo como ponto focal
a idéia de relação e a possibilidade de comunicação entre homens
e deuses, homens e espíritos, homens e ancestrais. Ou seja: em todas
as formas de religiosidade brasileiras, há uma enorme e densa ênfase
na relação entre este mundo e o outro, de modo que a
domesticação da morte e do tempo é elemento fundamental em
todas essas variedades ou jeitos de se chegar a Deus.
Por outro lado, a forma pela qual essa comunicação se realiza
é sempre através de um elo pessoal. Nós, brasileiros, temos intimidade
com certos santos que são nossos protetores e padroeiros, nossos
santos patrões; do mesmo modo que temos como guias certos orixás
ou espíritos do além, que são nossos protetores. A relação pode ter
forma diferenciada, mas a sua lógica estrutural é a mesma. Em todos
os casos, a relação existe e é pessoal, isto é, fundada na simpatia e na
lealdade dos representantes deste mundo e do outro. Somos fiéis
devotos de santos e também cavalos de santo de orixás, e com cada
um deles nos entendemos muito bem pela linguagem direta da
patronagem ou do patrocínio místico — por meio de preces,
promessas, oferendas, despachos, súplicas e obrigações que, a
despeito de diferenças aparentes, constituem uma linguagem ou
código de comunicação com o além que é obviamente comum e
brasileira.
Do mesmo modo que temos pais, padrinhos e patrões, temos
também entidades sobrenaturais que nos protegem. E elas podem ser