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patrimônio público, pudesse rastejar pela lama com tanto despudor e em tão má companhia
nos anos seguintes.
Ingenuidade minha e dos tantos que ficaram chocados com as denúncias de corrupção e
as negociatas que desfilavam no noticiário diário? Talvez. Mas acredito que pode e deve ser
diferente. Que a ética — seja na vida pessoal ou na pública — é essencial e não descartável
no primeiro aperto. Milhões de brasileiros pobres que resistem ao crime e à contravenção,
mantendo-se honestos contra todas as adversidades, nas favelas e periferias do país, nos
provam isso todos os dias. Tornar a ética um artigo de luxo, que se coloca ou tira do cardápio
conforme as necessidades do momento, é zombar desse esforço pessoal e coletivo,
empreendido diariamente por brasileiros de todas as classes — mas com um custo muito
maior para os mais pobres.
Essa é a parte que me preocupa na aprovação majoritária de Lula no poder. O que ela nos
diz? A vida da maioria das pessoas melhorou de verdade — e esta é uma excelente razão
para aprovar um governo e um governante. Mas que a falta de ética, o fisiologismo e a
corrupção, que também ficaram aparentes nesse governo, não pesem pelo menos um pouco
nessa conta é triste. Porque aí somos aquele tipo de gente que só se importa com o dinheiro
no bolso — e nada com os valores que os puseram ali. Seria melhor para nós e para o país
que fôssemos melhores que isso.
Como jornalista, cheguei a estudar seriamente a possibilidade de pedir transferência para
Brasília, em 2003, com o objetivo de cobrir a mudança de costumes na capital federal. Eu
esperava testemunhar um outro tipo de elite política provocando transformações na forma
de se relacionar não só nas esferas oficiais de poder, mas nos restaurantes, nas casas e nas
ruas sem esquinas de Brasília. Ainda bem que tive de abortar o projeto por razões pessoais.
Algo mudou, é verdade, mas não no rumo que se esperava.
O comportamento da primeira família também despertava minha curiosidade. Quando
cobri a eleição de 2002, vale a pena lembrar, Lulinha (Fábio Luís Lula da Silva) era apenas
aquele garoto que acompanhava a mãe nos eventos de campanha. Formado em biologia, o
mais significativo que ele havia feito até então era um estágio no zoológico de São Paulo.
Lulinha era simpático e falava meia dúzia de palavras a mais que dona Marisa Letícia, que
não pronunciava nenhuma. Naquele momento eu não apostaria um real que Lulinha tivesse
esse progresso meteórico e pudesse se transformar no empresário rico e bem-sucedido,
exemplo de sucesso que é hoje. Dona Marisa manteve o mutismo público nos oito anos como
primeira-dama, mas apenas isso. De todas as seduções do poder, parecia difícil supor que
seriam as cirurgias plásticas e os tratamentos estéticos, as roupas de grife, o cabeleireiro a
tiracolo e a companhia chique que a seduziriam mais.
Acho uma pena Lula acreditar tanto no próprio mito a ponto de às vezes soar como um
messias. É saudável para qualquer um, em algum momento do dia, parar tudo e olhar para