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professores ganhando a indignidade que ganham, a maioria deles descomprometidos com
seu trabalho e sem serem avaliados por sua atuação em sala de aula?
A educação é uma das principais causas de desigualdade, e o Brasil continua sendo um dos
países mais desiguais do mundo. Erradicar a miséria não é apenas garantir que todos os
brasileiros possam comer — o que é enorme, mas ainda é pouco. Há uma miséria subjetiva
que não se resolve com comida, mas com educação. O desafio maior que se impõe é
justamente o de qualificar o nosso desejo. É pela educação que as pessoas desejam mais (e
não apenas produtos de consumo), exigem mais de si mesmas e do país, e são capazes de
andar com suas próprias pernas, superando a mera transferência de renda e os programas
assistenciais.
Diante da catástrofe educacional vivida pelo Brasil, não dá para fazer apenas o possível.
Tem de dar um jeito de fazer o impossível. Já, ontem. E Lula não fez. Mesmo simbolicamente
ele não fez. Com o capital simbólico de Lula, teria feito diferença vê-lo alguma vez com um
livro na mão. Em vez disso, houve ocasiões em que Lula reforçou a falsa dicotomia entre a
experiência prática e a intelectual. Posso compreender seu esforço em valorizar a “escola da
vida”, historicamente relegada como algo menor. Mas ele deveria ter a clareza de mostrar
que não há oposição entre um e outro, pelo contrário, são conhecimentos que se
complementam e dialogam entre si.
Nas ocasiões em que Lula colocou um tipo de conhecimento em oposição ao outro, prestou
um grande desserviço ao Brasil. Como ao inaugurar o campus de Sorocaba, da Universidade
Federal de São Carlos, e referir-se à importância de um governante conhecer seu país. Para
conhecer o país que governaria, afirmou ter preferido percorrê-lo (na Caravana da Cidadania,
em 1993) a ler Raízes do Brasil, a obra clássica de Sérgio Buarque de Holanda. “Eu poderia
ter lido o livro do Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, e poderia ter conhecido um
pouco o Brasil. Mas eu achava que, em vez de a gente apenas ler um livro e dizer que a gente
conhecia, era melhor que a gente botasse o pé na estrada para ver a megadiversidade deste
país.”
Seria tão melhor se Lula tivesse dito que é importante ler o livro e é importante percorrer
as estradas e conversar com o povo. Afirmasse que uma experiência amplia a outra. Que
ambas foram e são importantes. Afinal, a educação, o acesso aos livros, a possibilidade de
inscrever sua experiência na literatura são o que foi roubado dos mais pobres durante
séculos. Uma pessoa deve lamentar que não pôde ler ou estudar e reivindicar maior acesso
aos livros e à educação — mas, se orgulhar da falta de leitura, nunca. E nunca mesmo se esta
pessoa é presidente de um país em que boa parte da população não entende o que lê.
Espero que Dilma Rousseff tenha a clareza de transformar a educação em prioridade de
fato. E Lula possa aproveitar o tempo livre para ler Raízes do Brasil e muitos outros livros.