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Capítulo 7
A alimentação enquanto relação visceral
com o pescado na vila de Regência e
algumas pontuações sobre os seus desvios
pós-lama da Samarco
Bianca de Jesús Silva
Clara Crizio de Araujo Torres
INTRODUçãO
A presente proposta se concentrou em evidenciar os cortes de rede
(STRATHERN, 2011) que foram observados a partir da obrigatoriedade
judicial de auxílio emergencial aos afetados pelo crime socioambiental
da ruptura da barragem de rejeitos de mineração da empresa Samarco
S.A., ocorrido no dia 5 de novembro de 2015. Analisaremos os processos
de liberação e proibição da pesca, bem como as incertezas sobre o consu-
mo e distribuição do pescado, junto às discussões sobre os laudos técnico-
científicos enquanto relacionados ao corte de rede de que estamos tratan-
do. Buscamos, a partir dessa estrutura de análise, indicar as relações de
nossos interlocutores com o pescado após o rompimento da barragem de
rejeitos de mineração da Samarco, atribuindo também importância para
se pensar o desastre sobre a perspectiva ontológica (ALMEIDA, 2003) da
alimentação na comunidade de Regência Augusta, e aos seus modos de
inventar (WAGNER, 2010) sobre as incertezas com relação ao pescado.
Nas nossas discussões, as reflexões sobre a alimentação passaram a ter um
destaque durante as saídas de campo e o acompanhamento das notícias
sobre o rompimento da barragem de rejeitos de mineração, que despejou
milhões de metros cúbicos do conteúdo antes retido: “[...] aquilo que con-
vencionou-se chamar localmente de “lama da Samarco” – formada por
partículas de solo e minérios de ferro combinados com arsênio, chum-
bo, mercúrio, manganês, cádmio, cobre e zinco – desceu pelo Vale do Rio
Doce atingindo toda a sua população (JUSTIçA GLOBAL, 2015)” (apud
LEONARDO et al., 2017, p. 25). As observações surgiram devido ao que fi-
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