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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização

               cou ressaltado entre as primeiras imagens sobre a chegada dos rejeitos no
               rio Doce, nas quais estão presentes vários animais mortos, em sua maio-
               ria peixes. A partir das inquietações provocadas pelas imagens citadas,
               passamos a observar de modo mais sistemático a questão nos trabalhos
               de campo durante as saídas realizadas entre dezembro de 2015 e maio de
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               2017. Estávamos em frentes de trabalho  que não eram específicas sobre
               a alimentação, a pesca ou o consumo do pescado, mas, ao trabalharmos
               a noção de evento crítico apresentada por Veena Das (1995) e a partir da
               perspectiva sobre o fazer etnográfico de Strathern (2014), identificamos,
               durante as experiências de campo, uma relevância sobre a temática que
               se fez presente em grande parte das atividades que realizamos em Re-
               gência Augusta, vila que está localizada na foz do rio Doce, onde este se
               encontra com o mar, no município de Linhares (ES).
               A discussão sobre a alimentação e a centralidade dessa atividade esteve
               presente em vários trabalhos antropológicos, como, para citar alguns exem-
               plos, na apresentação dos primeiros mitos trabalhados no volume 1 das
               mitológicas “O cru e o cozido” de Lévi-Strauss (1991); em Viveiros de Cas-
               tro (2002), na discussão sobre o perspectivismo ameríndio, colocando em
               evidência a importância das relações de predação nessas ontologias; e nas
               colocações de Strathern (2006) sobre o cará e o inhame e a importância des-
               sas raízes na alimentação nas terras altas ocupadas por povos da Melanésia.
               Desse modo, buscamos refletir sobre as posturas em relação à construção
               das práticas de conhecimento (STRATHERN, 2014) presentes nas questões
               sobre os desdobramentos da alimentação em determinados contextos sim-
               bólicos, bem como sobre a alteração das relações viscerais e emocionais
               (TADDEI, 2014a; 2014b) dos regencianos com relação ao pescado.
               1   Os trabalhos foram desenvolvidos no âmbito do período de execução do Programa de Ex-
               tensão intitulado “Áreas protegidas e grandes projetos de desenvolvimento no horizonte de
               vivências das comunidades locais: os impactos socioambientais e os seus desdobramentos”,
               financiado pelo PROEXT/MEC, ao longo do biênio 2016-2017. Também foram cruciais as
               atividades desenvolvidas ao longo do segundo semestre de 2016, com a execução da pesquisa
               intitulada “Depois da Lama: os atingidos e os impactos na Foz do Rio Doce”, aprovada no
               edital aberto para a seleção e contratação de estudos sobre avaliação dos danos causados pelo
               rompimento de barragens de rejeitos de mineração e seus impactos ao longo da bacia do Rio
               Doce (Fundo de doação: coletivo de artistas #SouMinasGerais e #RiodeGente. Gestão e im-
               plementação: Greenpeace-Brasil). As pesquisas supracitadas foram coordenadas por Aline
               Trigueiro Vicente e Flávia Amboss Merçon Leonardo, respectivamente. Ambas as pesquisas
               são vinculadas ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Populações Pesqueiras e Desenvolvi-
               mento no Espírito Santo (GEPPEDES).




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