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Vidas de Rio e de Mar: Pesca, Desenvolvimentismo e Ambientalização

               ausência de respostas claras e ações efetivas por parte da Fundação Reno-
               va e do Estado tem reforçado a necessidade da auto-organização dos atin-
               gidos. Neste sentido, a própria chegada do Movimento de Atingidos por
               Barragem (MAB) ao Espírito Santo junto com a lama é um aspecto que
               merece destaque. Mais recentemente, os atingidos têm se organizado em
               comissões de atingidos, a exemplo do que parece ter ocorrido em Mariana
               e Barra Longa, no intuito de construir uma proposta de assessoria técnica
               independente em um processo que tem sido acompanhado pelo MPF.
               A iniciativa soa como uma resposta à demora da Fundação Renova e dos
               órgãos estatais competentes de responder questões básicas como se há
               contaminação do solo, da água, dos peixes e de produtos agropecuários
               da região. Mais do que sanar as dúvidas acerca desses aspectos cotidia-
               nos, a intenção é construir, ainda que tardiamente, as ferramentas neces-
               sárias para que o diálogo entre os atingidos e a Samarco possa se dar de
               forma menos desigual.
               Se, por um lado, a maioria dos atingidos pelo crime não possui sequer um
               advogado, por outro, a criação da fundação de direito privado – à reve-
               lia dos atingidos e com a objeção dos Ministérios Públicos e Defensorias
               Públicas – com o aporte financeiro das mineradoras evidencia a assime-
               tria dessa relação. Ao passo que as últimas agenciam redes técnicas, ór-
               gãos estatais (desde os de controle ambiental às agências de fomento de
               pesquisa) e uma vasta rede de funcionários e pesquisadores, os atingidos
               nesse processo de auto-organização têm contado com o apoio da Igreja
               Católica e de organizações como o Fórum em Defesa do Rio Doce, o pró-
               prio MAB, alguns coletivos e grupos de pesquisa e extensão universitários
               – além do acompanhamento nos limites das possibilidades do MPF e da
               Defensoria Pública do Espírito Santo.

               Neste sentido, consideramos a iniciativa das comissões de atingidos e a dis-
               puta por assessoria técnica como um input positivo no sistema que tem se
               delineado com a gestão do desastre, podendo seu resultado fazer pender
               um pouco mais a balança para o lado dos atingidos na sua emergência
               como atores coletivos nos processos de negociação com a empresa. A tí-
               tulo de conclusão, realçamos a necessidade de iniciativas independentes
               de informação, formação e assessoria aos atingidos, para que possam
               participar do processo de planejamento ao qual estão expostos – mesmo





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