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Capítulo 1
dos pela Marinha firmaram suas raízes na trajetória da política pesqueira.
A diferença nessa fase é que ao passo que no período anterior o pescador
foi conduzido à reserva naval da marinha, como vimos na primeira seção,
neste, sua força de trabalho foi reservada às empresas pesqueiras, através
da desvalorização da sua atividade, apropriando-se da sua força de tra-
balho, meios de produção e recursos pesqueiros, transformando os pes-
cadores artesanais em meros “coadjuvantes” do setor (RAMALHO, 2014).
Essas medidas adotadas pela SUDEPE supervalorizaram a indústria pes-
queira, considerando que os benefícios fiscais alcançavam somente as
empresas, e estas concentraram seus projetos na construção e importação
maciça de barcos, equipamentos e infraestrutura de terra, aumentando
consideravelmente o controle dos meios de produção (SILVA, 2015). Desta
forma, a condução dessa política resulta no controle dos meios de produ-
ção e da força de trabalho do pescador, e não aponta para nenhum tipo de
valorização de seus modos de vida e identidade.
Observa-se que, de um lado, com a intervenção da Marinha, entre 1919
e 1932, iniciou-se o processo de estigmatização do pescador artesanal,
visto como atrasado e de modos rudes, o qual precisaria ser civilizado.
Representações e imaginários sociais recheados de estereótipos sobre o
pescador ganharam relevo, conforme já assinalamos. De outro lado, as
ações políticas subsequentes, encampadas pelo Ministério da Agricultu-
ra e pela SUDEPE, não apenas vão intensificar esse tipo de leitura social,
mas utilizá-la como justificativa para promover modelos ainda mais ela-
borados de exclusão desse grupo, desta vez destituindo-o de seus instru-
mentos de trabalho e, por conseguinte, impedindo a reprodução de suas
maneiras de viver e trabalhar. O discurso em voga era de que as técnicas
utilizadas pelos pescadores eram obsoletas, por isso era urgente moder-
nizá-las. Somente assim o pescador artesanal deixaria de ser considerado
um entrave à pesca moderna (industrial) e passaria a compô-la, mas de
um modo especial: como mão de obra a ser explorada.
O projeto em curso era a criação de uma pesca empresarial-capitalista no
Brasil, através do fomento a incentivos fiscais visando o retorno de recur-
sos para o setor. Foi dessa forma que a SUDEPE negligenciou a pesca de
pequeno porte, ao decidir fazer da atividade pesqueira uma indústria de
base no país (DIEGUES, 1983). De acordo com Ramalho (2014), a produ-
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