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Mal’akh terminou de admirar a lâmina sagrada e voltou sua atenção para uma única tira de
velino grosso estendida sobre a mesa à sua frente. Ele mesmo o fabricara utilizando a pele de um
cordeiro. Como mandava o protocolo, o animal era puro e ainda não havia alcançado a maturidade
sexual. Ao lado do velino, uma caneta que fizera usando uma pena de corvo, uma salva de prata e três
velas dispostas em torno de uma tigela de bronze maciço. A tigela continha dois dedos de um líquido
espesso e rubro.
Era o sangue de Peter Solomon.
O sangue é a tintura da eternidade.
Mal’akh pôs a mão esquerda sobre o velino e, mergulhando a pena no sangue, desenhou com
cuidado o contorno da mão espalmada. Ao terminar, acrescentou os cinco símbolos dos Antigos
Mistérios, um na ponta de cada dedo desenhado.
A coroa... para simbolizar o rei em que irei me transformar.
A estrela... para simbolizar o céu que ordenou meu destino.
O sol... para simbolizar a iluminação da minha alma.
A lamparina... para simbolizar a luz tênue da compreensão humana.
E a chave... para simbolizar a peça que falta, aquela que hoje à noite finalmente será minha.
Mal’akh completou o traçado de sangue e admirou seu trabalho à luz das três velas. Esperou o
sangue secar, então dobrou a pele grossa de cordeiro três vezes. Enquanto entoava um antigo e etéreo
sortilégio, encostou o velino à terceira vela, fazendo-o pegar fogo. Colocou a pele em chamas sobre a
salva de prata e deixou-a queimar. Enquanto se consumia, o tecido animal se decompunha, ficando
carbonizado. Quando a chama se apagou, Mal’akh transferiu as cinzas com cuidado para a tigela de
bronze cheia de sangue. Então mexeu a mistura com a pena de corvo.
O líquido adquiriu um tom mais fechado de vermelho, quase preto.
Segurando a tigela com as duas mãos, Mal’akh a ergueu acima da cabeça e agradeceu,
entoando o antigo eukharistos de sangue. Então, despejou cuidadosamente a mistura enegrecida
dentro de um frasco de vidro e o fechou com uma rolha. Aquela seria a tinta que usaria para adornar a
pele não tatuada do topo da cabeça e completar sua obra-prima.
CAPÍTULO 82
A Catedral Nacional de Washington é a sexta maior do mundo e se eleva mais alto do que um
arranha-céu de 30 andares. Enfeitada com mais de 200 vitrais, um carrilhão de 53 sinos e um órgão de
10.647 foles, essa obra-prima da arquitetura gótica tem capacidade para acomodar mais de 3 mil fiéis.
Naquela noite, porém, a imensa catedral estava deserta.
O reverendo Colin Galloway — decano da catedral — dava a impressão de estar vivo desde
sempre. Curvo e mirrado, usava uma batina preta simples e avançava às cegas, com passos
arrastados, sem dizer palavra. Langdon e Katherine o seguiam, igualmente em silêncio, em meio à
escuridão dos 120 metros do corredor central da nave, que fazia uma levíssima curva para a esquerda
de modo a criar uma suave ilusão de ótica. Quando chegaram à Grande Divisória, o decano os
conduziu até o outro lado do arco cruzeiro — separação simbólica entre a área pública da igreja e o
altar mais adiante.
Um cheiro de olíbano pairava no ar do presbitério. O espaço sagrado estava escuro, iluminado
apenas por reflexos indiretos nos arcos do teto decorados com folhas. Bandeiras dos 50 estados
americanos pendiam acima do coro, enfeitado com uma elaborada série de retábulos retratando cenas
da Bíblia. O decano Galloway continuou andando; aparentemente, conhecia o trajeto de cor. Por um
instante, Langdon pensou que estivessem indo em direção ao altar-mor, onde estavam encravadas as
10 pedras do monte Sinai, mas o velho decano finalmente virou à esquerda e atravessou tateando uma
porta discretamente oculta que conduzia a um anexo administrativo.
Eles percorreram um corredor curto até a porta de um escritório que exibia uma placa de latão:
REVERENDO DR. COLIN GALLOWAY
DECANO DA CATEDRAL
Galloway abriu a porta e acendeu a luz para seus convidados. Ele os fez entrar na sala e fechou
a porta.