Page 296 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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O  burro  espichou  naturalmente  as  orelhas...  o  que  também  foi  tão
                  engraçado  que  todos  caíram  outra  vez  na  gargalhada.  Tentavam  ficar
                  quietos, mas não era possível.

                        - Você pediu o auxílio de Tash - prosseguiu Aslam - e no templo de
                  Tash  será  curado.  Suba  ao  altar  de  Tash  em  Tashbaan,  no  Festival  de
                  Outono, este ano, e lá, à frente de todos, perderá sua forma de asno, e todos
                  saberão que o asno é na verdade o príncipe Rabadash. Mas, enquanto viver,
                  se uma só vez afastar-se mais de dez quilômetros do templo de Tashbaan,
                  voltará a ser como é agora. E de uma recaída jamais ficará bom.

                        Fez-se um curto silêncio. Depois todos se agitaram e olharam uns para
                  os outros, como se estivessem acordando. Aslam havia partido. Só restava
                  um  lampejo  no  ar  e  na  relva,  e  júbilo  nos  corações,  o  que  lhes  dava  a
                  certeza  de  que  não  fora  um  sonho.  Além  do  mais,  o  burro  estava  lá  na
                  frente deles.

                        O rei Luna, o maior coração entre todos os homens, ao ver o inimigo
                  nessas lamentáveis condições, esqueceu toda a sua ira.
                        -  Alteza  -  disse  -  estou  sinceramente  sentido  que  as  coisas  tenham
                  chegado a este extremo. Não dependeu de nós, e Vossa Alteza sabe disso.
                  Teremos o maior prazer em providenciar o seu embarque para Tashbaan
                  para...  para  aviar  a  receita  prescrita  por  Aslam.  Terá  na  viagem  todo  o
                  conforto que permitir a sua atual situação: o melhor barco de transporte de
                  gado... as cenouras mais frescas e...

                        Mas  um  zurro  ensurdecedor  e  um  coice  na  perna  de  um  guarda
                  demonstraram  claramente  que  essas  gentis  ofertas  foram  recebidas  com
                  ingratidão.

                        E aqui, para tirá-lo do caminho, é melhor aca-

                        bar  com  a  história  de  Rabadash.  Enviado  de  volta,  compareceu  ao
                  Festival de Outono, tornando-se novamente homem. Umas quatro ou cinco
                  mil  pessoas  viram  a  transformação,  e  o  caso  não  pôde  ser  silenciado.
                  Depois  da  morte  do  velho  Tisroc,  quando  Rabadash  se  fez  tisroc  dos
                  calormanos,  tornou-se  o  mais  pacífico  tisroc  da  história  do  país.  Não
                  ousando afastar-se mais de dez quilômetros, jamais podia ir à guerra, e não
                  desejava que seus tarcaãs conquistassem fama guerreira às suas custas, pois
                  é  assim  que  os  tisrocs  são  destronados.  Apesar  do  egoísmo  dos  seus
                  motivos, foi bem mais cômodo para os pequenos países vizinhos.

                        Seu próprio povo jamais se esqueceu de que ele havia sido um burro.
                  Durante  o  seu  reinado  foi  cognominado  Rabadash,  o  Pacificador,  mas,
                  depois da sua morte, passou a ser Rabadash, o Ridículo. Ainda hoje, nas
                  escolas calormanas, se alguém faz alguma coisa bastante idiota, é chamado
                  de Rabadash.
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