Page 294 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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passara a noite sapateando, uivando e amaldiçoando, e não podia mesmo
                  estar na sua melhor aparência.

                        - Não preciso informar a Vossa Alteza - disse o rei - que, pelas leis
                  das  nações  como  também  por  todas  as  razões  de  uma  política  sensata,
                  temos  todo  o  direito  à  sua  cabeça.  Apesar  de  tudo,  levando  em
                  consideração  a  sua  juventude  e  a  sua  má-criação,  à  qual  faltam  ainda
                  gentileza e cortesia, estamos dispostos a enviá-lo em liberdade, desarmado,
                  sob as seguintes condições: primeiro...

                        - Maldito  cão  sarnento!  -  cuspiu  Rabadash.  -  Acha  que  aos  menos
                  ouvirei  as  suas  condições?  Eu!?  Fala  de  educação  e  não-sei-o-que-mais!
                  Muito fácil, com um homem acorrentado! Arranque de mim estas correntes
                  vis, me dê uma espada, e quem ousar que venha bater-se comigo.

                        Quase todos os senhores puseram-se de pé. Gritou Corin:
                        - Pai! Posso dar um soco na cara dele? Por favor!

                        - Paz! Majestades! Senhores! - disse o rei Luna. - Será que não temos
                  a  educação  necessária  para  ouvir  com  tranqüilidade  os  insultos  de  um
                  trapalhão? Sente-se, Corin, ou saia da mesa. Peço mais uma vez a Vossa
                  Alteza que escute as nossas condições.

                        - Não escuto condições de bárbaros e bruxos - respondeu Rabadash. -
                  Ninguém ouse tocar num fio do meu cabelo. Cada insulto que me lançam
                  será vingado com oceanos de sangue. Terrível será a vingança do Tisroc;
                  não perdem por esperar. Matem-me, no entanto, e as fogueiras e torturas
                  das  terras  calormanas  ainda  farão  o  mundo  tremer  daqui  a  mil  anos.
                  Cautela! Cautela! O raio de Tash cai de cima!

                        - E às vezes fica preso no caminho por um gancho! - disse Corin.

                        - Pare com isso, Corin - disse o rei. - Só insulte um homem mais forte
                  do que você. Assim, Alteza, por favor.
                        - Que idiota este Rabadash! - suspirou Lúcia.

                        E  logo  Cor  pôs-se  a  imaginar  por  que  todos  tinham  se  levantado  e
                  ficado  muito  quietos.  Também  fez  o  mesmo,  mas  só  depois  entendeu  o
                  motivo: Aslam estava entre eles, embora ninguém tivesse percebido a sua
                  chegada. Rabadash estremeceu quando o vasto vulto do Leão desfilou entre
                  ele e seus acusadores. E o Leão falou:

                        -  Rabadash,  cuidado!  Seu  destino  anda  próximo,  mas  talvez  ainda
                  possa evitá-lo. Esqueça o seu orgulho (do que você pode orgulhar-se?) e a
                  sua ira (quem lhe fez mal?) e aceite a compaixão destes bondosos reis.

                        Rabadash  então  revirou  os  olhos  e  espichou  a  boca  numa  horrível
                  careta, como um tubarão, e abanou as orelhas para cima e para baixo (não é
                  difícil  aprender  a  fazê-lo).  Sempre  achara  isso  muito  eficiente  entre  os
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