Page 658 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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NO LAGO DO CALDEIRÃO
Nos últimos dias de Nárnia, lá para as bandas do Ocidente, depois do
Ermo do Lampião e bem pertinho da grande cachoeira, vivia um macaco.
Ele era tão velho que ninguém se lembrava quando foi que aparecera por
aquelas bandas. E era o macaco mais enrugado, feio e astuto que se pode
imaginar. Ele morava numa casinha de madeira coberta de folhas,
empoleirada num dos galhos mais altos de uma grande árvore. Seu nome
era Manhoso.
Naquele recanto da floresta havia bem poucos animais falantes,
homens, anões ou qualquer tipo de gente. Apesar disso, Manhoso tinha um
vizinho, que era também seu amigo, um jumento chamado Confuso. Pelo
menos eles se diziam amigos. Na verdade, porém, Confuso era mais um
empregado que amigo de Manhoso. Era ele quem fazia todo o serviço.
Quando iam juntos para o rio, Manhoso enchia os alforjes de água, mas
quem os carregava até em casa era Confuso. Quando precisavam de alguma
coisa das cidades, que ficavam bem longe, rio abaixo, era Confuso quem
descia com os paneiros vazios às costas e voltava depois com eles, pesados
de tão cheios. E tudo que ele trazia de melhor e mais gostoso quem comia
era Manhoso, pois, como este costumava dizer: “Você bem sabe, Confuso,
que eu não posso comer capim e forragem como você. Por isso é claro que
eu preciso compensar de outras formas...” E o jumento respondia: “Claro,
Manhoso, claro. Eu sei disso.” Confuso nunca reclamava, pois sabia que
Manhoso era muito mais sabido que ele, e até achava que, afinal de contas,
era muito gentil da parte dele ser seu amigo. E se, por acaso, Confuso
tentava discutir com ele sobre alguma coisa, Manhoso sempre dizia: “Ora,
vamos, Confuso, eu sei muito melhor do que você o que precisa ser feito.
Você sabe muito bem que não é nada inteligente, não é mesmo?” E
Confuso concordava: “É verdade, Manhoso. Você tem toda a razão. Eu não
sou sabido mesmo.” E acabavam fazendo sempre o que Manhoso queria.
Uma manhã, no comecinho do ano, os dois andavam passeando à
margem do Lago do Caldeirão. O Lago do Caldeirão é o grande lago que
fica logo abaixo dos penhascos na extremidade oeste de Nárnia. A enorme
cachoeira precipita-se dentro dele com estrondo, como se fosse um eterno
trovão, e o rio de Nárnia brota pelo outro lado. Por causa da cascata as
águas do lago estão sempre dançando, agitadas, borbulhando e fazendo
círculos como se estivessem continuamente fervendo. Por isso é que se