Page 9 - JornalJunho2020(11ªEdição)
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Jornal Escolar do Agrupamento de Escolas de Monção junho 2020
A teimosia da lágrima mente dois padrões de vida como nunca balho resistem à exaustão e a todas as dificulda-
antes. Para uns, o confinamento a quatro des, e foram imensas e de vária ordem: físicas,
Há circunstâncias na vida em que contar uma paredes, com uma nesga de varanda, em logísticas, familiares, emocionais… . Neste âmbito,
história é a melhor forma de abordar os aconteci- alguns casos; para outros, porém, o jar- quero enviar uma palavra de apreço aos meus co-
mentos. Talvez porque, para mim, a vida assume o dim, a horta e o quintal serviram-lhes de legas, amigos e familiares professores, que nunca
formato de uma narrativa, feita de muitas histórias, refúgio ao ar livre e uma fonte de exercí- descuraram as suas funções, nem aligeiraram a
ou porque desta forma conseguimos tecer um véu cio criador e produtivo, bem desejado responsabilidade para com os agentes alvo da sua
que cobre ou encobre a realidade, deixando a des- nesta época primaveril. Em qualquer das circuns- profissão, os alunos.
coberto o sonho ou o pesadelo. O tempo e o espa- tâncias, perdeu-se a noção do tempo mensurável, E a lágrima teimava.
ço constituem o cenário mais ou menos dinâmico, de modo que o calendário, em muitos casos, tor- A lágrima pairava com medo próprio e dos nos-
ao sabor das funções e propósitos das persona- nou-se redundante – o sábado e segunda-feira sos. Movemos legiões de convivas e centenas de
gens. ditavam os mesmos afazeres, confundindo o valor abraços longínquos, inventamos “abreijos” conju-
Esta é uma delas que respeita todos esses pres- semântico de “holiday” e “workday”. Usufruímos a gados para a conter. Alucinamo-la, mas não a con-
supostos: cultura e a arte aos quadradinhos, como vinhetas fundimos, porque a razão está lá bem aconchega-
Havia dois dias que nascera março, à porta da vivas de histórias ilusoriamente síncronas, porém, da, mas não esquecida.
Primavera, o casaco ainda recentemente aconche- conjugadas em tempos e espaços diversos. Paulatinamente a vontade ergue-se, a força ro-
gante já começava a sobrar, embora aconselhasse A soma era a operação que as notícias diaria- bustece-se, mas a malha urdida ao longo do tempo
o bom senso que não se desprezasse. Os dois mente mais evidenciavam. Só que estas não eram por uma comunidade diversa e concorrente para o
meses anteriores faziam eco de ondas distantes meros exercícios abstratos, mas sim resultados mesmo artefacto rasgou-se aqui e ali e terá que
que receosamente se aproximariam. E assim acon- concretos de vidas suspensas em sofrimento, sub- ser remendada com arte, resiliência e mestria. As
teceu: da Ásia para a Europa, Oceânia, África e traindo, em muitos casos, membros queridos de lições do tempo presente juntamente com heran-
América se foi espalhando como um tsunami, que muitas famílias. Efetivamente, o medo era e é real. ças da história serão o campo para florescer. A
os receios não afastaram. Neste contexto, destacaram-se uns novos heróis ciência numa procura incessante de restabelecer a
Quinze dias apenas tardaram até que as famílias (bem diferentes daqueles que vivem na imagina- saúde, abre-nos caminhos de esperança e faz-nos
se isolassem “em confinamento”. Avós e netos per- ção das crianças) que cuidam de nós nos hospi- acreditar que esta será mais uma das muitas bata-
deram afetos mútuos, interditos que eram os beijos tais, nas enfermarias e em cuidados intensivos, lhas anteriormente por ela vencidas. O perigo con-
e abraços e até o contacto dos seus olhares, tra- que incansavelmente zelam por nós, extenuados tinua bem presente nas comunidades, ainda que
vando a vida, adiando os eventos que até então pelo trabalho longo e exigente, escafandrados, nem sequer ousemos fazer a chamada, com um
eram considerados imperiosos. Apenas virtualmen- escondendo o cansaço em indumentárias diversas receio enorme de o acordar. O Adamastor é real-
te passaram aparentemente a ser possíveis. Os que os cobrem da cabeça aos pés, confundindo-os mente um gigante que todos queremos transpor,
vidros das janelas assumiram o papel de nos de- com astronautas em viagens à Lua ou a Marte. mas cada etapa representa um enorme labor, para
volverem as imagens do mundo lá fora e formas de E a lágrima teimava. o qual pedimos a ajuda de Deus.
saborear sorrisos e feições dos que nos querem, Para além destes, muitos outros que continuaram E todos, cada um à sua maneira, resistimos à
mas também esses, mascarados e sem expressão. a fazer o seu habitual trabalho para nos servir, me- teimosia da lágrima.
A diferença da cidade e da aldeia vincou indelevel- recem o nosso apreço. Teresa Simões Pereira,
Outros ainda há que a partir de casa em teletra- professora aposentada
Poemas do 7ºC
“História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar”, de Luís Sepúlveda
No porto de Hamburgo, É tão satisfatório ver animais E o grande momento iria chegar.
Lá ao longe vi algo… De outras espécies ajudarem as ou- A gaivota levantou voo,
Pensei serem barcos tras A chuva e o vento não a afetava
Mas não! Eram dois amigos E conseguirem superar diferenças E olhando para trás,
Cúmplices de aventuras, banais. Despedia-se, abanando a sua asa.
Um duo improvável E Ditosa voou com o seu gato no co- A vida irá sempre me surpreender
De almas puras, ração. Beatriz Nunca numa coisa desta eu não po-
Um gato muito amável O que me encheu de emoção! Vou contar-vos uma história dia crer,
E uma gaivota sempre atenta, Sobre um gato e uma gaivota Ver uma gaivota indefesa e inocente
Que, com seu apetite, Gabriel Gonçalves Ele tinha de a ensinar a voar Ser protegida por um gato diferente.
Quer sempre saber qual é a ementa. Numa noite chuvosa Até parece uma anedota É uma amizade linda e pura,
Entre tanta asneira, Em Hamburgo, Tudo começou com uma gaivota Que começou como uma missão.
Às vezes sai asneira. Unidos eternamente, Que estava quase a morrer
Tão diferentes, tão iguais… O gato Zorbas e a Gaivota Ditosa Então pôs um ovo Depois de ter um começo duro,
Sempre à procura da próxima brinca- Passearam atentamente E obrigou o gato a prometer Acaba como um ensino de compai-
deira. Entre ruas e jardins. Que dele ia cuidar xão.
Ricardo Barbosa Como dois amigos Pinguins, E quando nascesse Lindo é ver essas almas
Passeavam lentamente Repletas de sentido de dever
Uma gaivota sonhadora, Entre árvores lindamente. Ensiná-la-ia a voar Quando, nós que mesmo nas cal-
Que não está sozinha, Passou-se um mês e a gaivota cres- mas,
Sonha em ser uma excelente voadora Um gato meigo e sabedor ceu Nem sempre sabemos ter.
Desde que é pequenina. Pai e mãe se tornou, Sempre com os gatos dela a cuidar Nada foi mais comovente
Pela natureza zelou Do que me envolver nesta missão
Ao longo de meses, E tornou-se Salvador. Até que um dia ela percebeu
A sua força tem-se esgotado. Que tinha que aprender a voar Para cumprir uma promessa
Porém tentou muitas vezes, Entre os pingos da chuva, Foram muitas tentativas Movida pela determinação.
Dando um bom resultado. Nas ruas de Hamburgo abençoadas, Mas nenhuma resultou Unidos para sempre
A gaivota aguardava Ficam o gato e a gaivota,
Rodrigo Rei Então decidiram vir falar comigo
Pelas nuvens já sonhadas. Numa história onde há emoção
É incrível … O que muito os ajudou Que se tornou uma lição.
A amizade que gatos têm! Frederico Foi num dia chuvoso Joel Paçô
É inigualável Noite chuvosa em Hamburgo estava, Na torre de S. Miguel
Ver o sorriso desta gaivota que na E o medo de Ditosa aumentava. Estava muito ansioso
cara contém. Zorbas queria vê-la a voar Para ver se ia resultar
Por isso as escadas tiveram que su- E foi isso que aconteceu
É tão bom ver uma gaivotinha bir
Dar o seu primeiro passo. Para assim o medo da gaivota fugir. A gaivota conseguiu voar
Consegui ver o desespero que a gai- Uma grande amizade se formou
vota tinha Subindo então as escadas, E entre a gaivota e o gato uma união
Em levantar cada asinha. Chegaram ao topo do campanário. se eternizou.
A gaivota estava prestes a voar Cristiana Pombo
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