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Capítulo 8 A Flor do Açafrão
Todos os que já estiveram nas trilhas das montanhas, principalmente acima
dos cinco mil metros sabem que ali o silêncio tem uma qualidade diferente.
É mais profundo, pungente, completo. É um silêncio que se espalha, envolve,
se fixa e subjuga. É poderoso e definitivo e faz igualmente silenciosos os seres
que vivem nestas paragens áridas. E é sem dúvida um traço marcante e que
distingue os seres das montanhas, a faculdade de viverem plenamente
atuando com todo e qualquer movimento, no mais absoluto silêncio.
São também extremamente atentos, os seres das montanhas, e é bom que
assim sejam, porque nos caminhos dos altiplanos e entre os poderosos
paredões de pedra e ravinas e precipícios infinitos, as similaridades confundem
e as semelhanças enganam nossa percepção e se não estiverem, os seres que
vivem ali, acostumados aos percursos entre as rochas e pradarias de vegetação
rasteira, se não aprenderem a diferenciar os arbustos que parecem idênticos,
as rochas que são tão iguais e as trilhas que se misturam, se confundem e que
parecem sobrepor-se magicamente umas às outras iludindo os sentidos e
parecendo determinar os destinos sempre na mesma direção, certamente
acabarão perdidos e sem chance de sobrevivência.
Mas o viver nestes lugares com tamanha exigência de atenção e adaptação
provoca um refinamento muito especial dos sentidos e os seres desenvolvem
capacidades extraordinárias, fazendo os movimentos das próprias vidas
acontecerem numa harmonia perfeita e muito íntima ao ritmo da natureza.
Os seres passam a ser verdadeiras extensões do que acontece ao seu redor.
Aprendem a perceber diminutas, quase inexistentes, particularidades. Assim,
a multiplicidade deslumbrante de cores, como os verdes que para o olhar
comum não apresentam nenhuma diferença, aos habitantes das montanhas
gritam suas nuances e servem para marcar os caminhos, as rochas idênticas