Page 84 - Os Lusiadas Contados as criancas e lembrado ao povo
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Depois a África, inculta e cheia de selvagens, com o Cabo Tormentoso, que
até há pouco se negara a deixar passar os Portugueses, terra imensa de
Infiéis, quase infinita.
E Tétis, sempre desejosa de falar dos Portugueses, dizia a Vasco da Gama
apontando o Globo:
— «Vê o grande Império de Benomotapa, cheio de gente bárbara, onde o
padre português Gonçalo da Silveira padecerá morte e vitupério, por não
ter a mesma religião dos Pretos.
«Neste lugar encontra-se o oiro brilhante, que desvaira tanta gente.
«Lá está agora o lago profundo, onde nasce o Rio Cuama ou Zambeze.
«As casas dos Negros não têm portas, porque são leais e fiéis uns aos
outros, e não há, portanto, ladrões entre eles.
«Mas, como inimigos, são cruéis.
«Vencê-los-ão um dia os Portugueses, que apenas em número de trinta e
cinco desbaratarão imensa multidão desses selvagens!
«Mais acima, repara, veem-se as nascentes do Nilo, rio inçado de
crocodilos, que rega as regiões da Abissínia. O Rei e soldados deste pais não
vivem em palácios nem entre muros que os protejam, mas em
acampamentos, entregando à coragem de todos a sua defesa e a do povo.
«Será na Abissínia que um filho teu, Cristóvão da Gama, acudindo em
auxilio do Imperador dessas terras, vencerá os Turcos duas vezes, para
depois, numa cilada, ser feito prisioneiro e morrer, pobre dele, degolado!...
«Vê mais adiante a costa do Mar, onde o Rei de Melinde te deu
hospitalidade, e o Rio Rapto e a povoação de Quilimance.
«Está aqui o Cabo Guardafui ou Arómata, onde começa o Mar Roxo — que
tem esse nome por causa da cor das areias do fundo.