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LOSURDO. PRESENÇA E PERMANÊNCIA


           madura de Marx, portanto, continuava a dar centralidade à dinâmica
           do capital, sem deixar de reconhecer que particularidades (raça, etnia
           e nacionalidade) pudessem ser determinantes da totalidade (ANDER-
           SON, 2019, p. 355).
                Naquele contexto, contudo, o debate marxista sobre a questão na-
           cional não se referia unicamente à influência que os apelos nacionalistas
           tinham sobre os trabalhadores, mas também ao papel dos partidos liga-
           dos à classe operária, uma vez que estes passaram a sofrer pressões pelas
           demandas nacionalistas dos trabalhadores (HOBSBAWM, 1992). Deste
           modo, conforme ressaltou Hobsbawm (IBIDEM, p. 10), para o movi-
           mento comunista, a nação existiria tanto para cumprir funções de um
           tipo de Estado territorial quanto como aspiração para seu estabelecimen-
           to, como também no contexto de um determinado estágio de desenvol-
           vimento tecnológico e econômico. Quando o movimento comunista co-
           meçou a tratar da questão nacional, praticamente todo teórico marxista
           importante participou do debate, como Otto Bauer, Rosa Luxemburgo,
           Kautsky e Lênin, demonstrando a importância assumida pelo assunto
           no fim do século XIX (IDEM, 1988, p. 205). Consequentemente, o deba-
           te passou a ser travado na II Internacional Socialista, espaço de elabora-
           ção e atuação do movimento comunista naquele contexto.
                Em 1896, a II Internacional aprovou, em seu congresso em Lon-
           dres, o direito universal à autodeterminação de todas as nações. Em
           duas resoluções, a questão aparece claramente: “o Congresso se declara
           a favor da autonomia de todas as nacionalidades” e “o Congresso de-
           clara que, qualquer que seja o pretexto, religioso ou dito civilizador, da
           política colonial, ela não é senão a extensão do campo de exploração ca-
           pitalista, no interesse exclusivo da classe capitalista” (CARONE, 1991).
           Posteriormente, no Congresso de 1900, condenou-se de forma unânime
           o colonialismo, sobretudo em razão da Guerra dos Bôeres . Em 1903,
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           o programa do Partido Socialdemocrata dos Trabalhadores da Rússia,

           7  A Guerra dos Bôeres (1899-1902) aconteceu com a invasão da África do Sul pela Inglaterra. Em 1902, 500 mil
           soldados britânicos forçaram a África do Sul a se submeter ao Império britânico. Porém, o custo foi extremamente
           alto. A construção dos primeiros campos de concentração, algo até então desconhecido, com a prisão de mulheres
           e crianças, gerou uma comoção mundial. Cf. Smith (2000) e Frieden (2008).

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