Page 134 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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simples circunstância de um pedido ter sido decidido não é suficiente para produzir coisa julgada
material ou tornar a questão decidida indiscutível.
A coisa julgada material é a qualidade que torna indiscutível a declaração ou o efeito declaratório
contido na sentença. A coisa julgada somente incide em face de algumas sentenças. Não diante das
sentenças da “jurisdição voluntária” e das que decidem o pedido de tutela cautelar, uma vez que a
“declaração” contida nestas sentenças é inapta para produzir coisa julgada material, ou melhor, não é
propriamente declaração ou declaração para efeito de coisa julgada material.
A sentença, para produzir coisa julgada material, deve ser capaz de declarar a existência ou a
inexistência de um direito. Se o procedimento não outorga às partes adequada oportunidade de
alegação e produção de prova, ou melhor, de exercício do contraditório, nele jamais se poderá chegar
a um juízo capaz de permitir a “declaração do direito”, mas apenas a um juízo idôneo a autorizar uma
“declaração sumária”, que, por sua própria natureza e origem, não terá força suficiente para gerar a
imutabilidade típica da coisa julgada.
Se o juiz rejeita a tutela cautelar por entender que o fato, ainda que evidenciado, não gera situação
perigosa suficiente à sua concessão, não há como admitir a renovação do pedido de tutela cautelar
com base na mesma circunstância fática. Mas a proibição de reutilização da mesma circunstância
fática ou do mesmo fato indicador do perigo obviamente nada tem a ver com coisa julgada. Nem
mesmo se pode aceitar a tese de que a negação da tutela cautelar impede a invocação de fato que
poderia ser utilizado para demonstrar o perigo, conforme pretendeu Giuseppe Tarzia no ensaio
“Rigetto e Riproponibilità della Domanda Cautelare”, publicado na Rivista di Diritto Processuale. 268
O autor, para pedir tutela cautelar, não precisa alegar todos os fatos que poderiam convencer o juiz
da sua necessidade. Fatos não alegados, mas já existentes, podem fundar novo pedido de tutela
cautelar. Não há como aglutinar ou imantar os fatos que podem fundar o pedido de tutela. Cada um
deles constitui um fundamento para o pedido de tutela cautelar. Portanto, não há preclusão na não
alegação de fato que já existia à época do requerimento da tutela cautelar negada. Proíbe-se apenas a
reiteração de fato já descartado como capaz de indicar situação perigosa suficiente para a concessão
da tutela, o que obviamente não se confunde com coisa julgada material, constituindo apenas
manifestação da proibição do bis in idem.
Nos casos de não propositura da ação principal no prazo legal (art. 309, I, CPC) e de não efetivação
da tutela cautelar em trinta dias (art. 309, II, CPC), a parte pode renovar o pedido de tutela cautelar
com base em “novo fundamento”. Este novo fundamento não pode ser o fato reconhecido como
perigoso para a concessão da tutela cautelar que perdeu a eficácia. O fato deve ser outro, suficiente
para a concessão de nova tutela cautelar. Este fato, distinto do que fundou o pedido de tutela cautelar
que perdeu a eficácia, é o “novo fundamento” que permite a renovação do pedido nos termos do
parágrafo único do art. 309.
Note-se que o parágrafo único do art. 309, ao aludir a “novo fundamento”, não tem preocupação
alguma com a probabilidade do direito. O seu objetivo é impedir a renovação do pedido com base no
mesmo fato que levou à concessão da tutela cautelar que perdeu a eficácia. Assim, ainda que cesse a
eficácia da tutela cautelar, a parte pode requerer novo pedido de tutela cautelar com base em fato
novo ou com base em fato já existente, mas não alegado. Só não lhe é possível requerer tutela cautelar
com base no mesmo fato perigoso que fundou a tutela cautelar cuja eficácia cessou.
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