Page 61 - A CAPITAL FEDERAL
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Lola – Por esta carta, a única coisa que encontrei no cofre! Ainda por cima escarneceu de mim! (Tem tirado a
carta da algibeira.)
Mercedes – Deixa ver.
Lola – Depois! Agora vamos à polícia.Não! À polícia não!
As Três – Por quê?
Lola – Não convém. Logo saberão por quê. Vamos a um advogado! (Julga guardar a
carta, mas está tão nervosa que deixa-a cair.) Vamos!
As Três – Vamos! ( Vão saindo e encontram com Duquinha.)
Duquinha – Lola!
Lola (Dando-lhe um empurrão.) – Vá para o diabo!
As Três – Vá para o diabo! (Saem as cocotes. Figueiredo disfarça e apanha a carta que
Lola deixou cair.)
Duquinha (Consigo.) – Estou desmoralizado! Ela não me perdoa o ter saído, deixando-a
entregue à fúria do fazendeiro! Sou um desgraçado! Que hei de fazer?... Vou desabafar em verso...
Não! Vou tomar uma bebedeira!...(Sai.)
- Cena IV –
Figueiredo, Pessoas do Povo
Figueiredo – Ora aqui está como uma pessoa, sem querer, vem ao conhecimento de tanta
coisa! Vejamos o que o cocheiro lhe deixou escrito. (Põe a luneta e lê.)- “Lola. – Eu sou um pouco
mais artista que tu. Saio da tua casa sem me despedir de ti, mas levo, como recordação da tua pessoa,
as jóias e o dinheiro que pude apanhar no teu cofre. Cala-te; se fazes escândalo, ficas de mal partido,
porque eu te digo: 1º, que de combinação, representamos uma comédia pra extorquir dinheiro ao
Eusébio; 2º, que induziste um filho-família a contrair dívidas para presentear-te com jóias; 3º, que
nunca foste espanhola, e sim ilhoa; 4º, que foste a amante do teu ex-cocheiro – Lourenço.” Sim,
senhor, é de muita força a tal senhora Dona Lola!... Não há, juro que não há mulata capaz de tanta
pouca vergonha! (Sai.)
- Cena V –
Gouveia, Pessoas do Povo, depois Pinheiro
(Gouveia traz as botas rotas, a barba por fazer, um aspecto geral de miséria e desânimo.)
Gouveia – Ninguém, que me visse ainda há tão pouco tempo tão cheio de jóias, não
acreditará que não tenho dinheiro nem crédito para comprar um par de sapatos! Há oito dias não vou
à casa de minha noiva, porque tenho vergonha de lhe aparecer neste estado!
Pinheiro (Aparecendo.) – Oh! Gouveia! Como vai isso?
Gouveia – Mal, meu amigo, muito mal...
Pinheiro – Mas que quer isto dizer? Não me pareces o mesmo! Tens a barba crescida, a
roupa no fio... Desapareceu do teu dedo aquele esplêndido e escandaloso farol, e tens uma botas que
riem da tua esbodegação!
Gouveia – Fala à vontade. Eu mereço os teus remoques.
Pinheiro – E dizer que já me quiseste pagar, com juros de cento por cento, dez mil-réis que
eu te havia emprestado!
Gouveia – Por sinal, que disseste, creio, que esses dez mil-réis ficavam ao meu dispor.
Pinheiro – E ficaram. (Tirando dinheiro do bolso.) Cá estão eles. Mas, como um par de
botinas não se compra com dez mil-réis, aqui tens vinte... sem juros. Pagarás quando quiseres.
Gouveia – Obrigado, Pinheiro; bem se vê que tens uma alma grande e nunca jogaste a
roleta.
Pinheiro – Nada! – Sempre achei que o jogo, seja ele qual for, não leva ninguém para
diante. – Adeus, Gouveia... aparece! Agora, que estás pobre, isso não te será difícil!... (Sai.)
- Cena VI –