Page 150 - dan brown - o símbolo perdido_revisado_
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água ao redor do galho e ele forçou as bordas, tentando aumentar o furo. Puxou uma vez, duas vezes,
          e a abertura começou a crescer, ganhando vários centímetros de largura.
                 Apoiando-se no galho, ele inclinou a cabeça para trás e pressionou a boca contra a pequena
          abertura.  O  ar  de  inverno  que  entrou  em  seus  pulmões  pareceu  quente.  A  súbita  dose  de  oxigênio
          aumentou suas esperanças. Ele plantou os pés no tronco da árvore e empurrou com força para cima,
          usando  as  costas  e  os  ombros.  O  gelo  em  volta  da  árvore  caída,  perfurado  por  galhos  e  outros
          sedimentos, já estava enfraquecido e, quando ele forçou as pernas musculosas contra o tronco, sua
          cabeça  e  seus  ombros  conseguiram  quebrá-lo,  fazendo  Andros  irromper  na  noite  invernal.  Seus
          pulmões  se  encheram  de  ar.  Com  a  maior  parte  do  corpo  ainda  submersa,  ele  se  contorceu
          desesperadamente fazendo força com as pernas, puxando com os braços, até por fim conseguir sair da
          água e se deitar, ofegante, em cima do gelo liso.
                 Andros arrancou o gorro de esqui ensopado e o guardou no bolso, olhando rio acima em busca
          de  Peter  Solomon.  A  curva  do  rio  atrapalhava  sua  visão.  Seu  peito  recomeçou  a  arder.  Sem  fazer
          barulho,  ele  arrastou  um  pequeno  galho  e  tapou  o  buraco  no  gelo.  Quando  o  dia  amanhecesse,  a
          abertura já teria congelado novamente.
                 Enquanto Andros cambaleava para dentro do mato, começou a nevar. Ele não fazia  ideia da
          distância que havia corrido quando emergiu do meio do bosque para o acostamento inclinado de uma
          pequena rodovia. Estava com hipotermia, e sua mente delirava. Havia começado a nevar mais forte e
          um solitário par de faróis surgiu ao longe. Andros acenou desesperado, e a caminhonete encostou na
          mesma hora. Tinha placa de Vermont. Um velho de camisa quadriculada vermelha saltou lá de dentro.
                 Andros cambaleou na sua direção, segurando o peito que sangrava.
                 — Um caçador... me deu um tiro! Preciso... de um hospital!
                 Sem  hesitar,  o  velho  ajudou  Andros  a  se  acomodar  no  banco  do  carona  da  caminhonete  e
          aumentou a calefação.
                 — Onde fica o hospital mais próximo?
                 Andros nem desconfiava, mas apontou para o sul.
                 — Na próxima saída — improvisou. — Nós não vamos para hospital nenhum.
                 No  dia  seguinte,  a  polícia  foi  informada  sobre  o  sumiço  do  velho  de  Vermont,  mas  ninguém
          sequer  imaginava  em  que  parte  do  trajeto  ele  poderia  ter  desaparecido  em  meio  à  ofuscante
          tempestade  de  neve.  Tampouco  relacionaram  seu  desaparecimento  à  outra  notícia  que  dominou  as
          manchetes do dia seguinte: o chocante assassinato de Isabel Solomon.
                 Quando  Andros  acordou,  estava  num  quarto  desenxabido  de  um  hotel  barato  de  beira  de
          estrada que ficava fechado durante o inverno. Lembrava-se de tê-lo arrombado e de ter amarrado os
          ferimentos  com  lençóis  rasgados.  Depois  afundara  em  uma  cama  frágil,  debaixo  de  uma  pilha  de
          cobertores bolorentos, e simplesmente apagara. Agora estava faminto.
                 Foi mancando até o banheiro e viu a pilha de balas de chumbinho ensanguentadas dentro da
          pia.  Recordava-se  vagamente  de  tê-las  extraído  do  peito.  Erguendo  os  olhos  para  o  espelho  sujo,
          desfez com relutância as ataduras que lhe envolviam o corpo para avaliar os estragos. A musculatura
          sólida de seu peito e de seu abdômen havia impedido o chumbinho de penetrar fundo demais, mas,
          mesmo assim, seu corpo outrora perfeito estava arruinado pelos ferimentos. A única bala disparada por
          Peter Solomon aparentemente atravessara seu ombro de fora a fora, deixando uma cratera coberta de
          sangue.
                 Para piorar as coisas, Andros não havia conseguido obter o objeto que viera de tão longe para
          buscar. A pirâmide. Sua barriga roncava e ele saiu mancando do quarto até a caminhonete do velho,
          torcendo  para  encontrar  alguma  comida.  O  veículo  já  estava  todo  coberto  de  neve,  e  Andros  se
          perguntou quanto tempo passara dormindo naquele velho hotel. Graças a Deus eu acordei. Não achou
          nada para comer na cabine, mas encontrou alguns analgésicos para artrite no porta-luvas. Tomou um
          punhado de comprimidos, engolindo-os com a ajuda de vários punhados de neve.
                 Preciso de comida.
                 Algumas horas mais tarde, a caminhonete que saiu de trás do velho hotel em nada se parecia
          com a que ali chegara dois dias antes. Não havia mais capota cobrindo a carroceria, nem calotas, nem
          adesivos  no  para-choque,  nem  qualquer  outro  enfeite.  As  placas  de  Vermont  haviam  desaparecido,
          substituídas pelas de uma velha caminhonete de manutenção que Andros encontrara estacionada junto
          ao depósito de lixo do hotel, onde se livrara dos lençóis ensanguentados, das balas de chumbinho e de
          outros vestígios de que algum dia estivera ali.
                 Andros não havia desistido da pirâmide, mas por enquanto ela teria de esperar. Ele precisava se
          esconder, se curar e, acima de tudo, comer. Encontrou uma lanchonete de beira de estrada onde se
          entupiu de ovos com bacon e batatas fritas e bebeu três copos de suco de laranja. Ao terminar, pediu
          mais comida para viagem. De volta à estrada, Andros ficou escutando o velho rádio da caminhonete.
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