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FRAGMENTA HISTORICA Cristóvão Mendes de Carvalho ‐ História de um alto
magistrado quinhentista e de sua família
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1 O presente estudo sobre um alto magistra- de 19.7.1570 , portanto com cerca de 85 anos,
do das cortes de D. Manuel, D. João III e D. provavelmente em Lisboa. Era fidalgo, filho e
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Sebastião constitui, simultaneamente, um neto de altos funcionários da administração
exercício de Genealogia, entendida como a real, e ligado por parentesco próximo a
ciência que estuda o indivíduo social e a sua figuras proeminentes do seu tempo. Adiante
integração na respectiva corrente familiar; mas detalharei com pormenor a sua genealogia e
também uma perspectiva monográfica sobre a enquadramento familiar.
elite da 1ª metade do séc. XVI e sobre a Justiça Antes de apresentar a carta biográfica que, por
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e a administração pública, visão essa em boa morte de D. João III, o conselheiro Cristóvão
parte constituída pelo testemunho do próprio Mendes de Carvalho escreveu em 1557 ao
e balizada pela documentação que, a montante neto sucessor, o jovem D. Sebastião, então
e jusante, permite sustentar o que alega e ex- tutelado pela avó, a rainha D. Catarina, convém
plicar as circunstâncias. Neste relato, a todo traçar o essencial da sua biografia, para melhor
o momento nos deparamos, salvaguardadas se compreender o texto.
as distâncias, com situações que trespassam
os tempos e povoam a nossa actualidade. É A mais antiga referência em fonte primária
a História que se repete? A natureza humana que sobre ele encontrei é de 15.11.1494,
que não muda? Ou a própria especificidade do quando tirou ordens menores em Braga, teria
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nosso povo? nove anos de idade. É provável que se tenha
licenciado na Universidade de Salamanca, em
O Licenciado Cristóvão Mendes de Carvalho Leis ou em Cânones, curso que terá concluído
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é o magistrado em questão. Nasceu em por volta de 1510. A 20.3.1518 foi nomeado
Guimarães em 1485 e veio a falecer depois por D. Manuel I juiz de fora de Coimbra , tendo
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1 Agradeço a D. João de Noronha Osorio e ao Dr. José
Couceiro da Costa as informações que amavelmente 4 Nesta data, sendo do Conselho de D. Sebastião e seu
me disponibilizaram; ao Dr. Rui de Faria o auxílio na desembargador do Paço, assinou uma carta deste rei
investigação das escrituras notariais de Guimarães; e para o juiz e vereadores e procurador da Vila da Praia
ao Dr. Pedro Pinto quer o conselho paleográfico quer (Livro do Tombo da Câmara da Vila da Praia (1450-
as informações. 1666), Edição do Instituto Histórico da Ilha Terceira,
2 Embora também se documente como Cristóvão 2005, p. 41).
Mendes de Carvalho, aparece muitas vezes, na 5 Documenta-se que em 1564 vivia em Lisboa e que era
documentação coeva, referido apenas como Licenciado seu criado Francisco de Azevedo, escrivão nesta cidade
Cristóvão Mendes, simplificação normal nesta e (vide informação relativa à nota nº 317). Não consegui
noutras épocas. Em certas famílias, que tinham fixado determinar onde teria casa em Lisboa. A 19.12.1451 foi
o patronímico em associação com o nome da linhagem feito um acordo entre a Câmara de Lisboa e Cristóvão
desde o séc. XIII, como é o caso paradigmático dos Mendes de Carvalho, aí vereador, onde este desiste da
Soares de Albergaria, dos Gomes de Abreu e dos posse de um chão que tinha entre a torre da porta de
Mendes de Vasconcellos, justamente, o patronímico Alfama até à torre da porta do Chafariz dos Cavalos.
passou muitas vezes a significar a linhagem, como por (AHCML, Livro 1º da Vereação, Doc. 589).
exemplo claramente se vê nos Mello Soares ou Soares 6 Carta no sentido genérico (“Mensagem escrita que
de Mello. Também os Gomes de Abreu e os Mendes se envia ou recebe de alguém” – Dicionário da Língua
de Vasconcellos se documentam muitas vezes apenas Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de
como Gomes ou Mendes. Estes patronímicos têm neles Lisboa, 2001), pois na especialidade apresenta-se mais
o valor da linhagem. É o caso de Cristóvão Mendes de como uma petição, como adiante se dirá.
Carvalho, em que Mendes significa a linhagem paterna 7 ADB, Matrículas de Ordens da Mitra de Braga, Pasta
(Mendes de Vasconcellos), pela qual em geral é tratado, 5, fól. 133v. Em geral, as ordens menores eram tiradas
e Carvalho a linhagem materna. De recordar que então com 9 anos de idade. Diz a matrícula: “Cristouão filho
usavam-se os nomes em ordem inversa à actual (hoje de Ruy mendez Contador e de sua legitima molher anna
diríamos à espanhola), com o nome paterno primeiro Roiz de Carualho moradores na fregª de Stª maria de
e o materno depois. O nome Vasconcellos seria depois Gymarães deste arcebyspado”.
recuperado pelos netos de Cristóvão Mendes, os 8 ANTT, Chancelaria de D. Manuel I, Mercês, Liv. 10,
primeiros que documento em fonte primária coeva com fól. 127. Carta para juiz de fora da cidade de Coimbra,
o nome Vasconcellos. com 30.000 reais de mantimento anual, 20.000 pagos
3 Considerando que teria 9 anos quando tirou ordens pela fazenda real e os restantes 10.000 pelas rendas
menores e que seu pai já então era contador e viveria da cidade de Coimbra e, no caso de estas não serem
em Guimarães, onde em 1491 se documenta a morar. suficientes, seriam fintados os moradores e termo
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