Page 26 - Franz Kafka: A metamorfose
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parecia colada ao chão, na qual fizera todos os trabalhos de casa quando freqüen-
        tara a escola comercial, e, antes disso, o liceu e, pois era, até a escola primária... Não
        conseguia deter-se a analisar as boas intenções das duas mulheres, cuja existência
        quase tinha esquecido nessa altura, visto estarem tão exaustas que se dedicavam ao
        trabalho em silêncio, ouvindo-se apenas o pesado arrastar dos pés de ambas.
        Nestas condições, apressou-se a sair do esconderijo, ao mesmo tempo que as mul-
        heres, no quarto ao lado, se apoiavam na secretária, tomando fôlego. Quatro vezes
        mudou de direção, pois não sabia o que salvar primeiro. De repente, avistou na
        parede oposta, totalmente liberta de mobiliário, a figura da mulher envolta em
        peles; trepou rapidamente pela parede e colou-se ao vidro da moldura, que consti-
        tuía uma superfície à qual o seu corpo aderia bem e que lhe refrescava agradavel-
        mente o ventre
        escaldante. Pelo menos o quadro, que o corpo de Gregor ocultava totalmente, nin-
        guém havia de retirar. Voltou a cabeça para a porta da sala de estar, a fim de poder
        observar as mulheres quando regressassem.
        Pouco tinham descansado, visto que regressavam nesse momento, a mãe quase
        apoiada a Grete, que lhe passara o braço em torno da cintura.
        - Bem, que havemos de tirar agora? perguntou Grete, olhando em volta.
        Foi então que deparou com Gregor. Manteve a compostura, provavelmente em at-
        enção à mãe, e inclinou a cabeça para ela, a fim de evitar que levantasse a vista. Ao
        mesmo tempo, perguntou-lhe, em voz trêmula e desabrida:
        - Não será melhor voltarmos um instante ao refeitório?
        Gregor adivinhou facilmente as intenções de Grete: queria pôr a mãe a salvo e enxo-
        tá-lo seguidamente da parede. Muito bem, ela que experimentasse! Agarraria ao
        quadro e não cederia. Preferia avançar sobre o rosto de Grete.
        Mas as palavras de Grete não haviam logrado senão desassossegar a mãe, que deu
        um passo para o lado e encarou o enorme vulto castanho no florido papel da parede.
        Antes de tomar perfeita consciência de que se tratava de Gregor, gritou roucamente:
        - Ai, meu Deus! Ai, meu Deus!- e deixou-se desmaiar de braços abertos no sofá, não
        dando mais sinal de vida.
        - Gregor! - gritou a irmã, fitando-o com um punho cerrado erguido na sua direção.
        Era a primeira vez que se lhe dirigia diretamente depois da metamorfose. Correu
        à sala contígua em busca de um frasco de sais para reanimar a mãe. Gregor quis
        igualmente ajudar, pois havia tempo para salvar o quadro, mas teve de fazer grande
        esforço para se descolar do vidro. Ao consegui-lo, correu atrás da irmã para a sala
        contígua, como se pudesse aconselhá-la, a exemplo do que costumava fazer, mas
        não teve outro remédio senão deixar-se ficar desamparadamente atrás dela. Grete
        remexia por entre vários frascos e, ao virar-se, entrou em pânico ante a visão de
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