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Lama Padma Samten – Nascendo no Lótus
Esta consciência do lago é de grande importância, está nos ensinamentos dos mestres, e diz-se que
no meio da confusão, no meio do oceano de múltiplas coisas, de repente brota a luz do darmakaya, a
luz da natureza primordial, porque a história das nossas vidas é quase como um oceano de diferentes
coisas, ou um lago com ondas incessantes dos mais variados tipos. Mas, no meio disso, podemos
repentinamente ver algo que não são as ondas, não são as manifestações em si mesmas, é a condição
incessante da qual tudo pode surgir. Por exemplo, estamos nesta onda, mas nada impediria que vocês
recebessem um telefonema e essa onda se extinguisse rapidamente e vocês iriam fazer outra coisa.
Por outro lado, no meio dessa nossa onda, nada impediria que vocês recuperassem a condição do
lago e reconhecessem que a partir desse mesmo momento podem se levantar e fazer outra coisa, que
vocês têm a liberdade. As ondas vêm e vão, mas o lago está sempre disponível.
Natureza primordial, sabedoria primordial e responsividade
A natureza primordial refere-se a esse lago, a essa condição incessantemente presente, dia e noite. O
sonho da noite é uma onda também. Quando não entendemos isto encontraremos as instruções
sobre o sofrimento, que é descrito assim: o sofrimento surge pela ignorância, esta impossibilidade de
compreender a natureza primordial; também podemos descrevê-lo como a fixação às coisas
transitórias, como se cada uma delas fosse o centro de tudo. Também podemos descrever a
ignorância como responsividade, é como se nem tivéssemos a fixação, apenas respondêssemos como
uma criança que corre para lá, corre para cá, ela não tem a sensação de que há um problema ali, ela
simplesmente responde. A pessoa não diz: eu tenho a fixação de responder às coisas, nem a criança
diz: eu tenho a fixação de obedecer. Não tem nenhuma percepção disso, simplesmente ela se move
alegremente, de modo natural. Assim se dá a responsividade, assim se dá nossa fixação dentro da
ignorância. Isso é a ignorância, esse movimento natural de responsividade.
Porém, existe essa condição da presença, essa condição natural de liberdade na qual, independente
do que aconteça, percebemos que temos a liberdade de criar, de nos movimentar de modo não-
causal, não precisamos responder de modo causal. Essa condição começa com a experiência do lago e
não com a experiência da onda, não é uma experiência de oposição às ondas, é uma experiência de
acolhimento das ondas e, ao mesmo tempo, de independência das ondas, existe uma natureza nossa
que não precisa responder às coisas, ela se permite a ação não-causal e lúcida. Essa noção é a
essência da sabedoria primordial.
Nós possuímos a sabedoria primordial e a natureza primordial. A sabedoria primordial é este
levantar-se livres das ondas, o movimentar-se sem o processo causal. Não é porque alguma coisa
surge que nos movimentamos, é um movimento original, e isto é sabedoria primordial. A natureza
primordial é o lago, a sabedoria primordial é o fato de que o próprio lago pode produzir as ondas, ele
é independente das ondas que produz, ele é o movimento livre. Isto é a superação da ignorância.
A ignorância, por outro lado, é ficarmos fixados ou responsivos às ondas, esquecidos do lago, quando
só vemos as ondas. Mesmo que estejamos num retiro buscando lucidez, pode ser que tenhamos nos
esquecido dela, estejamos simplesmente respondendo aos eventos do próprio retiro, não
percebemos a liberdade que nos permitiu vir até aqui.
CEBB - Retiro Araras – maio 2009 5 / 43