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Lama Padma Samten – Nascendo no Lótus
meditação da lucidez. Aqui estou introduzindo vários temas, com isto introduzi o tema da não-
meditação. Assim, guardamos a palavra meditação, que tem um sentido tão amplo que inclui, num
caso particular, a não-meditação. Parece que a não-meditação se choca com a meditação fabricada,
aquela na qual criamos alguma coisa e à qual tentamos nos fixar. Por exemplo, shamata é uma
meditação fabricada, temos a instrução de corpo, o que pensar, o que seguir, o que estabilizar. Aqui
reconhecemos dentro de qualquer experiência essa condição livre. Essa é a nossa prática principal,
permitindo que entendamos que dentro dessa multiplicidade de experiências pode aparecer
repetidamente aquilo que sempre esteve ali. Ela é simples e misteriosa ao mesmo tempo, é esse lago,
a natureza do espaço, sempre houve, ela colhe as múltiplas manifestações. Então, quando estamos
dentro disso, o sofrimento é entendido também como ondas que vêm. Vocês irão perceber que o
sofrimento também não é constante. Isso é algo que deveríamos olhar, e desconfiar um pouco do
próprio sofrimento. Então, quando vem o sofrimento, dizemos para ele: “Você parece muito
importante, mas como é que você não aparece o tempo todo? Desaparece de vez em quando?” Isso é
curioso.
Chamou-me a atenção que, quando vamos ficando velhos, vamos a muitos enterros e velórios.
Lembro-me de vários desde a minha infância. Uma das coisas que me chamava a atenção é a pessoa
que está cuidando do morto. Ela está ali, mas quando chegam os parentes, vão abraçá-la, a pessoa
chora, aí senta de novo, aí chega gente, e chora de novo. Então, aparentemente, o sofrimento tem
flutuações, ainda que o morto esteja incessantemente presente ali do lado, o sofrimento flutua.
Parece que ele aumenta quando vem a solidariedade, isso é alguma coisa dura! É possível que algum
de vocês já tenha passado por isso. O nosso sofrimento aumenta também quando vem alguém, olha
para nós e diz: “Eu entendo a sua dor...” Ao abraçar, aquilo não é fácil, porque aquilo na verdade é o
retorno àquela onda, ela está disponível para nós, mas a onda não é a realidade totalmente
abrangente. No meio do nosso sofrimento o lago está presente, por isso a nossa mente se dispersa do
próprio sofrimento, ela vagueia em meio àquilo, ela se dirige a outros lugares. Aí vem alguém e nos
lembra de novo, nós sentimos, porque aquilo é real, é vivo dentro daquele contexto. Também
deveríamos olhar nossas experiências de sofrimento depois de dez anos, o sofrimento começa a ficar
remoto, cinza. Ainda que lembremos, precisamos de muita atenção para retornar às mesmas
condições de quando aquilo surgiu. Quando retornamos, choramos de novo, mas, na verdade, a
mente se dispersou devido a esse poder do lago.
Criação do samsara
O lago está incessantemente disponível. Ele propicia outras coisas, e assim a própria dispersão da
mente pode nos indicar a natureza que não se dispersa. Podemos tomar a multiplicidade das
experiências como referência para reconhecer a base dessas experiências da natureza primordial e
incessante, que tem como base a sabedoria primordial que nos permite reconhecer tudo isso como
uma energia primordial, que nos permite fazer as coisas surgirem, colocar movimento e brilho nas
coisas. Há uma sabedoria e luminosidade primordiais que nos permitem dar significado às coisas e
produzir luz e cor efetivamente. Esse é um atributo da natureza primordial. Curiosamente, esse
movimento propicia o surgimento da responsividade também, como se criássemos alguma coisa,
CEBB - Retiro Araras – maio 2009 7 / 43