Page 414 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Como  ficaria  muito  caro  levar  os  filhos  todos  para  os  Estados
                  Unidos, somente Susana tinha partido com os pais. A gente grande achava
                  Susana a mais bonita da família. Como era bem desenvolvida para a sua
                  idade  e  não  tinha  grande  queda  para  os  estudos,  a  mãe  dissera  que  “ela
                  aproveitaria  mais  a  viagem  do  que  os  outros  mais  novos”.  Edmundo  e
                  Lúcia fizeram o impossível para não sentir inveja de Susana, mas era de
                  fato horrível ter de passar as férias na casa da tia.

                         – Para mim ainda é muito pior – dizia Edmundo –, porque você terá
                  um quarto separado, enquanto eu terei de dividir o meu com aquele nojento
                  do Eustáquio.

                         A  nossa  história  começa  numa  tarde  em  que  Edmundo  e  Lúcia
                  aproveitavam juntos alguns minutos preciosos. Como é óbvio, falavam de
                  Nárnia, nome do país secreto deles. Acho que quase todos nós temos um
                  país secreto, que, para a maioria, é apenas um país imaginário. Edmundo e
                  Lúcia eram bem mais felizes: o país secreto deles era verdadeiro. Já tinham
                  até visitado Nárnia duas vezes, de verdade, não sonhando, nem brincando.
                  É claro que tinham conseguido chegar lá por Magia, que é a única maneira
                  de atingir Nárnia. E tinham prometido que lá voltariam algum dia. Assim,
                  você pode imaginar como eles falavam de Nárnia, sempre que podiam.

                         Naquela  tarde,  estavam  sentados  na  beira  da  cama  no  quarto  de
                  Lúcia, olhando para um quadro pendurado na parede – o único quadro de
                  que  gostavam  em  toda  a  casa.  Tia  Alberta  detestava  o  quadro,  mas  não
                  podia jogá-lo fora, pois fora presente de casamento de uma pessoa a quem
                  não queria ofender. Representava um barco navegando em nossa direção. A
                  proa  era  dourada  e  tinha  o  formato  de  uma  cabeça  de  dragão  de  boca
                  escancarada. Tinha apenas um mastro e uma grande vela quadrada de um
                  vivo tom de púrpura. As laterais do barco, só visíveis onde terminavam as
                  asas do dragão, eram verdes. Estava exatamente na crista de uma grande
                  onda  azul,  e  o  côncavo  da  vaga  mais  próxima,  franjada  de  espumas  e
                  salpicos, parecia vir para cima da gente. Via-se que corria ligeiro, impelido
                  por um vento forte, inclinando-se um pouco para bombordo. (A propósito,
                  se você está mesmo resolvido a ler esta história, acho melhor ter em mente
                  que a esquerda de um barco, quando se olha de frente, é bombordo, e a
                  direita é estibordo.) A luz do sol incidia sobre o lado inclinado do barco e a
                  água estava cheia de tons verdes e roxos. Do outro lado, o mar era azul-
                  escuro, devido à sombra do barco.

                         – Ficar olhando para um navio de Nárnia sem poder chegar lá é pior
                  ainda! – disse Edmundo.

                         – Olhar é sempre melhor do que nada – respondeu Lúcia. – E esse aí
                  é um verdadeiro navio de Nárnia.
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