Page 502 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Com estalos e rangidos de todo o cavername, o Peregrino lançou-se
para a frente quando os homens começaram a remar. Lúcia, na torre de
combate, teve a noção exata do momento em que entraram na escuridão. A
proa já havia desaparecido nas trevas e a luz do sol ainda brilhava na popa.
Viu-a sumir. Num instante a popa dourada, o mar azul e o céu estavam
todos iluminados pela luz do dia; no instante seguinte, o mar e o céu
desapareceram, e a única coisa que indicava onde terminava o navio era a
lanterna da popa. Na frente da lanterna, via-se a silhueta de Drinian ao
leme. Abaixo de Lúcia, duas tochas iluminavam um pequeno espaço do
convés e refletiam-se nas espadas e nos elmos. Mais adiante, no castelo da
proa, havia outra ilha de luz. Iluminada pela luz do mastro principal (que
estava exatamente acima de Lúcia), a torre de combate parecia um pequeno
mundo luminoso flutuando sozinho na escuridão. As próprias luzes, como
acontece sempre que temos de acendê-las a uma hora triste, pareciam
lúgubres e estranhas. Lúcia notou também que fazia frio.
Ninguém soube quanto tempo demorou a travessia nas trevas. Só os
ruídos dos remos indicavam que o navio estava andando. Edmundo,
olhando da proa, só via o reflexo da lanterna na água. O reflexo parecia
oleoso, e as ondas provocadas pelo avançar da proa pareciam pesadas,
pequenas e sem vida. À medida que o tempo ia passando, todos começaram
a sentir frio, com exceção dos remadores.
Súbito, sem se saber de onde, veio um grito não humano. Ou de
alguém em tal extremo de terror que havia perdido a humanidade. Caspian
tentou falar, mas tinha a boca demasiado seca, quando se ouviu a voz
chiante de Ripchip, mais alta que normalmente, no meio do silêncio.
– Quem chama? Se é um fantasma, não temos medo de fantasmas; se
é amigo, os seus inimigos aprenderão a ter medo de nós.
– Piedade! – gritou a voz. – Piedade! Mesmo que vocês sejam um
sonho, piedade! Recolham-me. Levem-me a bordo, mesmo que seja para
me matar! Mas não desapareçam, pelo amor de Deus, não me deixem nesta
terra horrível!
– Onde está? – gritou Caspian. – Suba a bordo.
Ouviu-se outro grito, de alegria ou de medo, e então perceberam que
alguém nadava na direção do navio.
– Preparem-se para içá-lo – disse Caspian.
Segurando cordas, vários marinheiros juntaram-se na amurada; um
deles, debruçando-se, empunhava uma tocha. Na escuridão da água
apareceu uma cara branca. Após algumas reviravoltas e puxões, doze mãos
amigas içaram o estranho para bordo.