Page 504 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Lúcia ouviu tudo lá do alto. No momento, um dos sonhos que tentara
                  intensamente  esquecer  viera-lhe  à  lembrança,  tão  nítido  como  se  tivesse
                  acabado  de  acordar.  Era  então  aquilo  que  estava  à  espera  deles,  naquela
                  ilha mergulhada na escuridão? Desejou descer ao convés e ficar junto de
                  Edmundo e Caspian, mas de que valia isso? Se era verdade que os sonhos
                  se  tornavam  realidade,  Edmundo  e  Caspian  podiam  transformar-se  em
                  qualquer coisa pavorosa antes que ela chegasse perto deles. Agarrou-se ao
                  parapeito  da  torre  e  tentou  acalmar-se.  Agora  remavam  para  a  luz  com
                  força total. Tudo estaria bem dentro de alguns segundos. Que bom seria se
                  tudo estivesse bem agora!

                         Ainda  que  as  remadas  fizessem  bastante  barulho,  não  conseguiam
                  quebrar  o  silêncio  absoluto  que  rodeava  o  navio.  Sabiam  todos  que  era
                  melhor  não  dar  ouvidos  aos  sons  que  vinham  da  escuridão.  Mas  ouvir
                  tinham de ouvir e, daí a pouco, todos ouviam, cada um de modo diferente.

                         – Estão ouvindo um ruído como... como uma tesoura enorme a abrir,
                  a fechar... ali? – perguntou Eustáquio.

                         –  Quieto!  –  disse  Rinelfo.  –  Estou  ouvindo  alguma  coisa  subindo
                  pelo costado.
                         – Foi para o mastro! – disse Caspian.

                         – Ai! – gritou um marinheiro. – Já começam os sinos! Sabia que isto
                  ia acontecer!

                         Caspian,  que  tentava  não  olhar  para  nenhum  ponto  (especialmente
                  não olhar para trás), dirigiu-se a Drinian, em voz baixa:

                         –  Quanto  tempo  remamos  até  chegar  ao  lugar  onde  apanhamos  o
                  homem?

                         – Talvez cinco minutos – ciciou Drinian. – Por quê?
                         – Porque já levamos mais tempo do que isso voltando.

                         Pelo  rosto  de  Drinian  corriam  bagas  de  suor.  Ocorria  a  todos  a
                  mesma idéia.

                         – Nunca mais sairemos daqui! Nunca mais! – gemiam os remadores.
                  –  Não  conseguimos  ir  para  a  frente.  Andamos  em  círculo.  Nunca  mais
                  sairemos daqui!

                         O  estranho,  que  jazia  enrodilhado  no  convés,  sentou-se  e  estourou
                  numa gargalhada horrenda.
                         – Nunca mais sairemos daqui! – gritou. – Isso mesmo. Nunca mais!
                  Fui um louco pensando que eles me deixariam partir assim tão facilmente.

                  Não, não, nunca mais sairemos daqui!
                         Lúcia apoiou a cabeça no beirai da torre e murmurou:
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