Page 636 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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bananeiras, rodeando Carvão e Floco de Neve. O príncipe teve de contar a
                  história do encantamento e da libertação pelo menos umas dez vezes.

                         Foi assim que acabaram chegando à beira da fenda. Tinha mais de
                  trezentos metros de comprimento e uns duzentos de largura. Desceram dos
                  cavalos e foram olhar da beira da fenda. Um calor forte bateu-lhes no rosto,
                  misturado  a  um  cheiro  bem  diferente  de  todos  os  outros  conhecidos:
                  intenso, agudo, excitante, e provocava espirros. O fundo da brecha era tão
                  brilhante  que  a  princípio  os  deslumbrou;  nada  puderam  ver.  Quando  se
                  acostumaram  puderam  distinguir  um  rio  de  fogo  e,  nas  margens  deste,
                  campos  e  bosques  de  um  fulgor  quente  e  insuportável  –  embora  fosse
                  fosco,  comparado  ao  rio.  Azuis  e  vermelhos,  verdes  e  brancos,  tudo  se
                  misturava. Pelas laterais ásperas da brecha, como pontos escuros contra a
                  luz de fogo, centenas de terrícolas desciam.

                         – Meus senhores – disse Golgo (e quando se viraram para ele nada
                  viram durante alguns segundos) –, meus senhores, por que não fazem uma
                  visita  a  Bismo?  Seriam  mais  felizes  lá  do  que  naquela  terra  nua  e
                  desprotegida lá de cima. Não precisam demorar, se não quiserem.

                         Jill  estava  certa  de  que  ninguém  daria  atenção  ao  convite.  Mas,
                  horrorizada, ouviu o príncipe dizer:
                         – Está aí, Golgo amigo, já estou meio inclinado a ir com você. Não
                  devemos  perder  uma  aventura  maravilhosa  como  esta;  talvez  nenhum
                  homem  mortal tenha visitado Bismo. E eu não saberia, à medida que os
                  anos  fossem  passando,  como  agüentar  o  arrependimento  de  não  ter
                  experimentado o que estava ao meu alcance: conhecer as profundezas da
                  Terra. Mas pode um homem viver lá? Vocês não moram no próprio rio de
                  fogo?

                         – Oh, não! Nós, não! Só as salamandras vivem no próprio fogo.

                         – Que espécie de salamandra? – perguntou o príncipe.

                         – Difícil dizer de que espécie. Doem na vista. Parecem uns pequenos
                  dragões. Falam conosco lá do fogo. São incrivelmente inteligentes, muito
                  engraçadas e talentosas.

                         Jill deu uma olhada para Eustáquio. Tinha certeza de que ele gostaria
                  ainda menos do que ela da idéia de descer por aquela brecha. Seu coração
                  gelou quando viu que a expressão dele mudara. Parecia-se muito mais com
                  o príncipe do que com Eustáquio do Colégio Experimental. Pois todas as
                  aventuras que viveu em sua viagem com o rei Caspian estavam outra vez a
                  excitá-lo.
                         – Alteza – disse ele –, se aqui estivesse meu velho amigo Ripchip,
                  ele  diria  que  recusar  as  aventuras  de  Bismo  seria  desacreditar  a  nossa
                  honra.
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