Page 631 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 631

fosse fogo) e subir às terras altas, na esperança de encontrar o caminho do
                  túnel novo. Ao contrário dos outros três, parecia bem satisfeito. Assoviava
                  e às vezes cantarolava uma velha balada sobre o lendário Corin Punhos de
                  Ferro, da Arquelândia.

                         A verdade é que estava tão feliz por ter-se libertado da magia negra,
                  que  os  perigos  do  presente  não  passavam  de  uma  brincadeira.  Para  os
                  outros, é claro, a cavalgada era tenebrosa.

                         Atrás deles ouvia-se o ruído de barcos abalroados ou de prédios que
                  desabavam.  Acima  via-se  a  grande  mancha  de  luz  lúgubre.  À  frente,  o
                  misterioso  clarão.  Da  mesma  direção  chegava  um  continuado  alarido  de
                  gritos,  choros,  assovios,  risos,  guinchos,  bramidos.  Fogos  de  artifício
                  riscavam  o  ar.  Ninguém  era  capaz  de  imaginar  o  que  significavam.  Nas
                  cercanias, a cidade era em parte iluminada pelo clarão e pelas diferentes
                  luzes dos sinistros lampiões dos gnomos. Mas existiam muitos lugares sem
                  luz alguma, mergulhados em treva. Desses lugares ou para eles é que saíam
                  ou entravam correndo os terrícolas, sempre de olhos pregados nos quatro,
                  sempre aflitos em busca de esconderijos. Havia carinhas e carões, olhões de
                  peixe e olhinhos de urso. Havia alguns emplumados, outros peludos, outros
                  com  chifres  e  trombas,  alguns  com  nariz  em  tira,  outros  de  queixo  tão
                  comprido  que  batia  no  peito.  Às  vezes  um  grupo  chegava  bem  perto.  O
                  príncipe brandia a espada e fingia atacá-los. E as criaturas, com todos os
                  tipos de pios, guinchos e cacarejos, mergulhavam nas sombras.

                         Quando  já  tinham  subido  várias  ladeiras  e  se  achavam  longe  da
                  inundação,  quase  fora  da  cidade,  a  coisa  começou  a  ficar  mais  séria.
                  Estavam próximos do clarão vermelho, embora ainda não soubessem o que
                  fosse.  Os  inimigos,  entretanto,  podiam  ser  vistos  com  mais  nitidez.
                  Centenas  –  talvez  milhares  –  de  gnomos  vinham  na  direção  deles.  Mas
                  aproximavam-se  em  investidas  curtas;  quando  paravam,  encaravam  os
                  quatro cavaleiros.

                         – Se Sua Alteza me perguntasse – disse Brejeiro –, eu ia dizer que
                  aqueles caras pretendem cortar a nossa frente.
                         – É o que eu também acho. E não poderemos romper uma coluna tão
                  numerosa. Vamos levar os cavalos para bem perto daquela casa. Chegando
                  lá, apeie e corra para a sombra. A senhorita e eu iremos uns passos adiante.
                  É claro que algum desses capetas irá nos seguir; então você, que tem os
                  braços compridos, pegue um deles vivo (se conseguir). Podemos arrancar

                  alguma verdade dele ou saber o que têm contra nós.
                         –  Mas  os  outros  todos  não  vão  cair  sobre  nós  para  salvar  o
                  companheiro? – perguntou Jill, esforçando-se para que sua voz não saísse
                  trêmula.
   626   627   628   629   630   631   632   633   634   635   636