Page 630 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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perceptíveis como antes. Tudo continuava quieto e abandonado. Só quando
                  dobraram um corredor que dava para o salão nobre é que encontraram o
                  primeiro terrícola – uma criatura gorda e esbranquiçada, com uma cara de
                  leitão,  e  que  estava  a  deglutir  vorazmente  os  restos  de  comida  deixados
                  sobre  as  mesas.  Guinchou  (e  esse  guincho  também  lembrava  a  voz  dos
                  porcos), sumiu para debaixo de um banco, sacudindo a cauda, e antes que
                  Brejeiro  o  atingisse,  disparou  na  direção  da  porta  sem  que  pudesse  ser
                  perseguido.

                         Do  salão  passaram  ao  pátio.  Jill,  que  freqüentara  uma  escola  de
                  equitação aos domingos, sentiu o cheiro de estábulo (um cheiro simpático e
                  familiar quando aspirado num lugar como o Submundo).

                         – Caramba! – disse Eustáquio – Olhem ali! Um belo foguete subia de
                  alguma parte e estourava em lágrimas verdes.

                         – Fogos de artifício! – exclamou Jill, intrigada.
                         – Certo – disse Eustáquio –, mas não vá pensar que esses terrícolas
                  estão se divertindo. Deve ser um sinal.

                         – Um sinal vermelho para nós, apesar de verde – disse Brejeiro.

                         – Amigos – disse o príncipe –, quando um homem se lança numa
                  aventura como esta, deve dar adeus à esperança e ao medo; do contrário,
                  tanto a morte quanto a libertação podem não chegar a tempo de salvar-lhe a
                  honra e a razão. Alô, belezas! – com esta frase, abriu o estábulo. – Quieto,
                  Carvão! Calma, Floco de Neve!

                         Os  cavalos  estavam  assustados  com  as  luzes  estranhas  e  com  o
                  barulho.  Jill,  que  se  sentira  tão  acovardada  ao  caminhar  por  um  buraco
                  escuro, aproximou-se sem medo dos bichos inquietos, ajudando o príncipe
                  a colocar arreios e rédeas. Estavam lindos ao cruzar o pátio, meneando a
                  cabeça. Jill montava Floco de Neve com Brejeiro à garupa. Com um ecoar
                  de cascos, atravessaram o portão principal e ganharam a rua.

                         –  Bem,  não  corremos  o  risco  de  morrer  queimados  –  observou
                  Brejeiro,  apontando  à  direita.  –  Gosto  de  olhar  sempre  o  lado  bom  das
                  coisas. – A água batia ruidosamente contra as paredes das casas.
                         – Coragem! – disse o príncipe. – Esta rua é uma boa ladeira. A água
                  subiu apenas até a metade da colina mais alta. Deve subir muito na próxima
                  meia hora e pouco nas próximas duas horas. Tenho mais medo daquilo... –
                  e apontou com a espada para um comprido terrícola com focinho de javali,
                  seguido de mais uns seis de formas sortidas, que tinham deslizado de uma
                  esquina e se ocultado na sombra.

                         O príncipe os conduzia, sempre na direção do clarão avermelhado,
                  um pouquinho mais para a esquerda. Seu plano era contornar o fogo (caso
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