Page 18 - Os Manuscritos do Mar Morto
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                      1. A LITERATURA DE QUMRAN E O NOVO TESTAMENTO



                  1.1 A CARACTERIZAÇÃO DOS HABITANTES DE QUMRAN SEGUNDO AS

                  FONTES CLÁSSICAS



                         Um dos grandes problemas despontados com a descoberta dos manuscritos foi

                  quanto  à  identidade  daqueles  que  habitaram  o  Khirbet  Qumran,  nome  árabe  que
                  significa  ruínas  de  cinzas,  dado  atualmente  ao  complexo  existente  próximo  ao  mar

                  Morto. Através dos registros bíblicos, sabemos que existiam duas correntes judaicas no

                  século I d.C., conhecidas como fariseus (At 15:5; Lc 15;17) e saduceus (At 4:1; Mc
                  12:18;  Mt  3:7).  Flávio  Josefo  (37-95  d.C.),  historiador  judeu  que  legou  dados

                  importantes sobre a sociedade judaica de seu período, coloca ao lado dos fariseus e dos
                  saduceus uma terceira corrente judaica, conhecida como essênios (Guerra dos Judeus

                  II:  119-61;  Antiguidades  Judaicas  XVIII:  18-22).  Este ramo  judaico  muito

                  provavelmente  possui  sua  origem  com  o  movimento  dos  assideus  (do  hebraico
                  hassidim, que significa “os piedosos”), grupo religioso que se engajou na luta ao lado

                  dos macabeus (168-142 a.C.) contra Antíoco Epifânio, rei dos selêucidas da Síria (1Mc
                  2: 42-43). O motivo desse conflito se deve ao amplo programa de helenização da Judéia

                  proposto pelos selêucidas após a tomada da região aos ptolomeus do Egito.
                         Com a vitória da violenta resistência macabéia, o regime sacerdotal deveria ter

                  sido  restabelecido  às  mãos  dos  zadoqueus,  pois  há  séculos  a  gerência  sacerdotal  era
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                  efetuada  por  esta  linhagem.   No  entanto,  Jônatas  Macabeu  que  era  de  linhagem
                  asmoneana  usurpou  o  sacerdócio  indevidamente  entre  os  anos  152-142  a.C.

                  (Antiguidades  Judaicas  XIII:  5,  9,  171-172). O  resultado  desta  atitude  fez  com  que
                  houvesse  uma  cisão  entre  os  apoiadores  da  resistência,  originando  um  problema  de

                  natureza interna desta vez.

                         Este é o pano de fundo histórico utilizado pela maioria dos eruditos para situar
                  tanto a origem dos essênios quanto o posterior nascimento da comunidade de Qumran.  5





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                   O principal sacerdote do rei Davi, Zadoque, foi também o fundador da linhagem que durou até o século
                  II a.C. Josefo afirma que Zadoque foi o primeiro sumo sacerdote no Templo de Salomão (Antiguidades
                  Judaicas, X: 152).
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                    É certo que, o grupo sacerdotal que dirigia a comunidade de Qumran era pertencente à classe zadoquita.
                  Eles  seriam  os  descendentes  de  Zadoque,  que  segundo  a  tradição  deveriam  exercer  o  sacerdócio  em
                  Israel. Porém, após o rompimento, sob orientação sacerdotal, parte do grupo seguiu rumo ao deserto para
                  lá restaurarem o sacerdócio “válido” segundo o ponto de vista zadoqueu.
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