Page 80 - Os Manuscritos do Mar Morto
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que Jesus nasceu e se formou, que ele “crescia em sabedoria, graças e
tamanho diante de Deus e dos homens (Lc 2:52)” (2003:147, n. 45).
Posteriormente, as primeiras comunidades cristãs também se envolvem em atos
litúrgicos individuais ou coletivos. Com o passar do tempo, apesar das muitas
similaridades entre o culto judaico e cristão, aos poucos essa prática foi assumindo um
corpo diferenciado entre os cristãos, marcando um distanciamento entre o cristianismo e
o judaísmo.
3.1 HINOS DO MAR MORTO E HINOS CRISTÃOS: CONTINUIDADE OU
NOVA TRADIÇÃO?
Para analisar as possíveis relações entre as tradições hinárias do NT e tradições
anteriores, particularmente Qumran, é necessário traçar um paralelo entre elas.
A princípio, destaco a importância dos hinos registrados em Lucas 1:46-55,
conhecido como Magnificat; e em Lucas 1:68-79, este conhecido como Benedictus.
Ambos os trechos parecem inserções forçadas, acrescentadas posteriormente ao
texto e oriundos de uma fonte diferente. No caso do Magnificat, quando se analisa mais
de perto sua relação com o contexto, parece não haver harmonia entre o hino e o
restante do relato. Se do versículo 45 fosse dado um salto diretamente para o 56, não se
perceberia um “vazio” na descrição. Fica claro, então, que este hino foi inserido no texto
recorrendo a uma fonte distinta da utilizada para o restante do capítulo, embora não se
possa precisar se esta inserção foi de fato lucana ou posterior a ele. Pode-se ter certeza,
no entanto, que embora a fonte utilizada para a redação do Magnificat tenha sido outra,
ela provêm de um ambiente puramente judaico.
Há quem defenda, como Gourgues, que tanto o Magnificat como o Benedictus
possuem traços da redação de Lucas (1995:53). Isso mostraria que, na verdade, o hino é
obra de Lucas e não de um outro autor posterior. Segundo o autor citado, algumas
expressões do hino fazem alusão direta a Maria, o que provaria – a despeito de o hino
possuir uma pré-história – que o hino recebeu um “novo rosto” com a compilação de
Lucas. Termos como “sua serva” (v. 48) e “fez grandes coisas em meu favor” (v. 49),
se vistos como manifestações singulares de louvor, induzem-nos a pensar que foram
feitas modificações na estrutura do hino para que se pudesse adaptá-lo à história de
Maria.