Page 76 - Os Manuscritos do Mar Morto
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primeiras localidades pré-70 a terem contato com o Evangelho. Cada uma destas
localidades – e posteriormente outras como Antioquia, Éfeso, Egito e Roma – acabaram
tornando-se centros independentes de difusão do cristianismo, que por sua vez, eram
passivos do ambiente em que se encontravam (cf. RICHARD, 1995:8, n. 22).
Seria um erro pensar as comunidades cristãs do século I desconsiderando
aspectos econômicos, sociais e culturais. Levando estes aspectos em consideração,
compreendemos que comunidades religiosas de ambientes díspares tiveram suas
peculiaridades, sendo influenciadas por diferentes agentes e movimentos.
Analisando a literatura composta por estas comunidades, pode-se perceber que
cada uma tem preocupações próprias. Um determinado corpus procura dar respostas a
distintas questões enfrentadas pelas comunidades cristãs. Algumas questões levantadas
por determinado autor são comuns a todos os seus livros. No entanto, quando não existe
relação entre os livros bíblicos percebe-se o quão diferente são suas preocupações.
Encarar os escritos cristãos como não sendo inteiramente coesos e harmônicos
(tendo como base os livros canônicos do NT), nos ajuda a compreender quais eram as
preocupações do autor quando criou seu texto e/ou como manipulou sua fonte. As
mudanças e construções feitas por determinado autor são formas salutares que podemos
utilizar para compreender a circularidade cultural do período. É em meio a esse embate
de forças, sob uma complexidade sócio-cultural extremamente complexa, que podemos
encontrar as colaborações dos MQ.
No que diz respeito aos estudos dos saduceus e fariseus do século I, temos
muitas informações sobre sua atuação política e social, mas o mesmo não acontece com
os essênios. Muitos que se dedicaram ao estudo das facções judaicas do século I, não
deram o valor merecido aos essênios por estes não serem considerados “ativos” social e
politicamente. As fontes clássicas indicam que a atuação social dos essênios parece ter
sido limitada ou não foi tão incisiva como a dos saduceus e fariseus. Uma leitura sem
muitos questionamentos dessas fontes apresenta os essênios como um grupo de sectários
que se abstinham da política e que não dialogavam com outras tradições religiosas. No
entanto, os essênios têm um papel ativo na sociedade judaica, ainda que preocupando-se
particularmente com o campo religioso, muito mais que outros segmentos da sociedade
judaica.
Na análise das descrições clássicas e dos MQ percebe-se que a preocupação
central das comunidades essênias era a “restituição do verdadeiro Israel”; para tanto,