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Confinada dentro de si mesma (conclusão)

           No entanto, todas as estratégias que a jovem usava para se distrair de si mesma foram por água abaixo, quando
         foi decretado um confinamento no país para impedir a nova pandemia de se alastrar. Tal como o resto da popula-
         ção, Margarida passou a ficar retida em casa e começou a ter aulas online. Grande parte das horas em que se en-
         contrava acordada eram passadas dentro de quatro paredes à frente de um ecrã, quer seja porque estava a assistir
         a aulas quer seja porque estava a fazer videochamada com os seus amigos. Podendo manter estas ligações com o
         seu grupo de pessoas mais chegadas, Margarida pensou que nem tudo seria mau, afinal ela ainda tinha os seus
         amigos para a distrair, no entanto alguns problemas começaram a surgir, como por exemplo, muitas vezes a inter-
         net dela ia abaixo e a chamada acabava a meio, começou a ficar cada vez mais difícil contactar os seus amigos e,
         para dizer a verdade, uma videochamada não se compara nem de longe a um convívio em pessoa.
           Apesar de tudo, a jovem não desistiu de encontrar uma distração. Tentou recorrer aos pais, mas estes eram am-
         bos enfermeiros e passavam grande parte do seu tempo no hospital, os seus horários não eram compatíveis com
         os da filha. Margarida era filha única, então, a sua próxima opção era passar tempo a brincar com o seu gato preto
         denominado Carvão; a jovem tinha-o recebido no seu quinto aniversário de vida e foi ela a escolher o nome do ami-
         go de quatro patas. Infelizmente, Carvão já tinha uma certa idade e passava grande parte do seu tempo a dormir,
         pelo que a dona do felino desistiu e teve que procurar outra distração. Depois de muito pensar e procurar, a jovem
         acabou por se contentar com a opção menos criativa: o seu telemóvel.
            A solução ao início parecia resultar, mas como tudo o que é bom, chegou a um fim. Margarida não só começou a
         ficar entediada de olhar para a tela de um eletrónico como também começou a ter dores de cabeça frequentes por
         passar tanto tempo ligada a um ecrã, afinal tinha também que usar o computador para assistir às aulas online, o
         que duplicou o seu tempo ligada à internet. Depois de pensar sobre o assunto a jovem percebeu o que mais temia,
         tinha que começar a conviver consigo mesma.
            Margarida estava assustada, não sabia por onde começar, afinal ela não era muito de valorizar o seu tempo a
         sós, já foi muito bem explícito que preferia passar o seu tempo rodeada de pessoas. Decidiu então mandar uma
         mensagem aos amigos a perguntar o que estes faziam quando estavam sozinhos, deram-lhe sugestões, tais como
         tentar desenhar, escrever sobre o seu dia ou até escrever pequenas histórias para passar o tempo. Margarida agra-
         deceu e ainda ficou um pouco à conversa com eles para tentar adiar o inevitável, mas uns tinham trabalhos para
         fazer e outros simplesmente não queriam passar muito tempo a olhar para o telemóvel.
            A jovem decidiu, então, pôr em prática as sugestões dos amigos. Começou por tentar desenhar, mas rapidamente
         percebeu que esta atividade definitivamente não era para si, mal conseguia desenhar uma casa simples… . Tentou
         desenvolver algum tipo de história mas nada lhe vinha à cabeça, parecia que lhe faltava criatividade. Por último,
         decidiu tentar escrever sobre os seus dias, não sabia bem o que escrever então simplesmente relatou a sua situa-
         ção atual, estava confinada em casa e não sabia o que poderia fazer para se divertir e passar o tempo. Margarida
         olhou para o que tinha escrito e, pela primeira vez em muitos anos, refletiu sobre o seu estado atual. Começou a
         perceber que afinal não é muito comum alguém não saber o que o/a fazia feliz. Pegou novamente na caneta e es-
         creveu todos os pensamentos que lhe vinham à cabeça sobre a situação, primeiro pensou no porquê de ser assim
         tão pouco autocentrada, uma das ideias que a adolescente registou foi o facto de os pais não lhe darem muita aten-
         ção desde pequena por terem horários de trabalho tão extensos, se calhar por esse motivo a jovem interiorizou des-
         de tenra idade que existiam coisas mais importantes do que dar atenção a si mesma. Margarida ficou abalada com
         tal ideia, o tema realmente trouxe-lhe um peso enorme, mas mesmo assim decidiu continuar.
            Chegou à conclusão que devia saber mais sobre si própria, então passou a escrever todas as pequenas coisas
         que a jovem recordava que lhe traziam alegria. Foi um processo difícil de começar, por não estar habituada a fazer
         tal reflexão, mas a rapariga recusou-se a desistir e passadas algumas horas conseguiu ter uma pequena lista de
         coisas que lhe davam felicidade. O item número dois da lista era ver o pôr do sol na praia e o número oito era o chil-
         rear dos pássaros, Margarida lembrou-se que este era, na sua opinião, um dos barulhos mais belos no planeta,
         quando ouviu pela janela duas andorinhas a cantar.
            A partir desta quarentena, Margarida começou uma viagem de autodescoberta muito necessitada, foi uma viagem
         às vezes um pouco dolorosa que teve continuidade durante toda a sua vida, mas a rapariga não se arrependeu,
         tornou-se mais independente dos outros, habituou-se a fazer mais frequentemente uma introspeção para perceber
         como se sentia física e psicologicamente, aprendeu mais sobre si própria e um dos aspetos mais positivos desta
         viagem, para Margarida, foi o facto de que passou a saber apreciar a sua própria companhia. Afinal de contas, o
         confinamento imposto teve também os seus lados positivos.
                                                                                    Sofia Pereira n.º 22  12.º CT3


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