Page 10 - HOLOCAUSTO
P. 10
Lourença Coutinho e João Mendes da Silva, "cristãos novos" radicados na região
desde o Século XVII. Durante sua Infância de menino de engenho, teve anos vividos
entre o trabalho diário dos escravos e as brincadeiras nos canaviais.
Assustaram-se quando um tropel de cavalos invadiu o sítio de seu avô.
Guardas armados davam ordem de prisão para toda a família, “pais, tios, primos e o
avô de Antônio José, tão logo recebem o papel do Santo Ofício, são recolhidos”. Difícil
dizer o que se passou na cabeça do pequeno, “crianças são hábeis, as fantasias
anestesiam qualquer dor. Deixar a casa protetora pode ser uma troca”. Não chora, “o
discurso do agente inquisitorial é incompreensível às crianças”.
“Encaminhados a um parente próximo (os dois únicos tios incólumes são
padres, Francisco Mendes da Silva e Bento Cardoso); aias e mucamas não podem ficar
com as crianças que aleitaram, mesmo porque aias e mucamas foram confiscadas”.
Conduzidos para o cárcere, seus pais e os demais parentes aguardavam vindo
da Corte, o navio que viria buscá-los, “descarregados e arrumados para receber
açúcar, ouro e hereges”. Era o ano de 1712. Antônio José tinha sete anos.
RITUAIS DA MALDADE
A Inquisição arrastou para o cárcere esta família inteira, tios e tias, maternos e
paternos, além de sua avó, viúva Brites Cardoso, com sessenta e sete anos. Toda a
família viajou na mesma frota, chegando a Lisboa em 12 de outubro de 1712.
Após meses nas masmorras, compareceram ao tribunal participando do auto-
de-fé de 9 de julho de 1913, e foram sentenciados a “cárcere e hábito penitencial
perpétuo”, penas que obrigavam a família se confessar e comungar em dias
determinados, e o cárcere era o compromisso de não sair do Reino sem licença da
Inquisição: “a família confinada em Lisboa, permaneceu sob constante vigilância”.
Antônio José foi preso pela primeira vez em 1726, juntamente com sua mãe,
Lourença Coutinho. Diante do inquisidor foi instado a confessar suas atividades
judaizantes, “e teve que jurar sobre os Evangelhos que diria a verdade. Foi-lhe então
sugerido que nomeasse, sem exceção, todos os seus conhecidos que viviam segundo a
Lei de Moisés, inclusive os mortos e os vivos, homens livres e prisioneiros, parentes e
estranhos, residentes em Portugal bem como no estrangeiro”.
Desse modo estaria salvando a sua alma, aliviando sua consciência e dariam
uma conclusão favorável à sua família, do processo a que respondiam. No Tribunal, a
mentira fazia parte das armadilhas, para forçar o réu recorrer à delação, durante o
interrogatório. Ele então relatou que “havia muitos anos, uma sua falecida tia, dona
Esperança, viúva de Diogo de Montarroio, do Rio de Janeiro, o persuadira em Lisboa a
viver segundo a Lei de Moisés”. Aconselhou-o a jejuar no Grande Dia Santo de
setembro e seguir todos os mandamentos dessa Lei, mas ouvindo um certo dia um
pregador falar sobre Nossa Senhora, resolveu retornar às práticas Cristãs e nunca
mais praticou a Lei Judaica.
O Tribunal achou pouco e exigiu que lhe fizesse novas confissões. Em razão de
Antônio José afirmar que nada mais sabia, resolveu submetê-lo a torturas. “Levaram-
no para a parte mais baixa do edifício. Médicos, um cirurgião e outros assistentes...
Antônio José da Silva foi despido e atirado no “potro” (uma estrutura de madeira
onde o acusado era amarrado com cordas que lhe cortavam as carnes). Enquanto o
amarravam, o escrivão declarou, de parte dos inquisidores, que estes declinavam de
toda a responsabilidade em caso de morte, ossos quebrados e perda de consciência
durante as torturas, uma vez que a recusa em confessar era culpa do próprio réu”.
10