Page 9 - HOLOCAUSTO
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Entre os anos de 1707 e 1709, a Inquisição de Lisboa recebeu do Brasil um
                  número superior a quinhentas pessoas, proveniente de várias capitanias, mas em maior
                  número do Rio de Janeiro. "As naus iam para o reino, levando dezenas de prisioneiros
                  acusados de judaísmo", incluindo famílias inteiras.
                           Em 1713 foram penitenciados "34 homens e 40 mulheres vindos do Rio". Na
                  procissão lúgubre se viam muitos parentes separados desde a prisão do Rio de Janeiro,
                  tais como "João Mendes da Silva e os irmãos: André, escrivão do Registro do ouro;
                  Bernardo  que  vivia  de  suas  rendas;  Luis,  capitão  de  Ordenanças;  as  irmãs  Aura,
                  Apolonia  e  Josefa;  a  mulher  Lourença  Coutinho,  a  sogra  Brites  Cardoso  e  os
                  Coutinhos  seus  cunhados;  Diogo,  médico;  Manoel,  sem  ofício;  Francisco,  Isabel,
                  Branca, esta última com o marido, Inácio Cardoso de Azevedo da mesma profissão de
                  João Mendes".
                           Muitos desses infelizes não eram hereges,  o seu crime era "terem nas  veias,
                  desta  ou  daquela  geração,  sangue  judeu.  Crime  que  se  considerava  muito  mais
                  afrontoso  que  o  de  bigamia,  sodomia  e  outros  ofensivos  à  moral  e  hediondos  à
                  sociedade".
                           O  braço  da  Inquisição  continuou  a  ceifar  vidas  nas  duas  primeiras  décadas
                  desse  século.  Em  1720  "relaxada  em  carne  e  osso",  ardeu  na  fogueira  em  Lisboa,
                  Tereza  Pais  de  Jesus,  parte  de  cristã  nova,  "mulher  de  Francisco  Mendes  Simões,
                  mestre de meninos, natural e morador no Rio de Janeiro... convicta, ficta, simulada,
                  confidente,  diminuta,  variante,  revogante  e  impenitente".  Com  tantos  "predicados"
                  que  justificassem  sua  sentença,  a  Igreja  arrastou  para  a  morte,  esta  senhora  de  65
                  anos. O julgamento de crianças era frequente no Tribunal do Santo Ofício, em 1723 foi
                  chamada perante os juízes, uma menina de 13 anos, para ser reconciliada "por culpa
                  de judaísmo".
                           Entre os sentenciados de 1728, achava-se Brita Lopes, imolada na fogueira no
                  dia 25 de julho com apenas 18 anos. Neste mesmo auto, achavam-se: "Antônio José e
                  seus irmãos mais velhos, André e Baltazar. João Gomes de Castro, o médico, irmão de
                  Brites Eugênia  e Branca, fora relaxado à justiça secular,  e devia  ser queimado vivo
                  nesta ocasião, mas como no ato de lhe atarem as mãos e ser-lhe notificada à sentença,
                  declarasse  ter  confissões  a  fazer,  foi  levado  de  volta  aos  calabouços  onde  fez  novas
                  declarações,  indigitando  por  compartes  nas  manifestações  do  judaísmo  a  várias
                  pessoas".
                           Por  esse  ato,  João  Gomes  não  conseguiu  salvar  sua  vida.  No  Auto  seguinte,
                  quinze meses depois, era levado à fogueira e "relaxado em carne". Diante da morte,
                  muitos  inventavam  denúncias  fictícias  ou  verdadeiras  na  esperança  da  salvação.
                  Condenar como covardia às fraquezas humanas é fácil, difícil é julgar um ser humano
                  sedento de liberdade, lutando para manter a própria vida diante das labaredas de uma
                  fogueira.  Acompanha-lo  nas  masmorras  pestilentas  das  prisões,  e  compreender  o
                  tempo  que  nos  separa  de  uma  sociedade  dirigida  por  uma  igreja  preconceituosa  e
                  mesquinha.  Segui-los  para  sofrer  e  morrer,  em  sua  caminhada  como  mártires  da
                  História.

                                                      ANTONIO JOSÉ

                           Antes  de  narrarmos  alguns  dados  da  vida  trágica  desse  poeta  brasileiro,
                  Antônio José da Silva, queremos informar que ele nasceu em terras de seu avô materno
                  Balthazar Rodrigues Coutinho em 1705, no engenho da Covanca, em Meriti. Filho de



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